Plano de Safra da Agricultura Familiar 2015/16: aperfeiçoamento das diretrizes para uma agricultura familiar sustentável

O Plano Safra da Agricultura Familiar significa mais do que alimento na mesa dos brasileiros. Representa a agroecologia, a diversificação no plantio, o desenvolvimento territorial, a cultura preservada, a qualidade de vida, os mananciais resguardados, a geração de energia, a redução da pobreza, o desenvolvimento interiorizado, o crescimento econômico com sustentabilidade. Representa a convivência solidária entre o campo e a cidade1.

O Plano de Safra 2015/16 concederá recursos de R$28,9 bilhões para financiar o custeio e o investimento da produção agroindustrial. Desse total, R$26 bilhões serão destinados aos agricultores familiares e assentados da reforma agrária, pelo Programa Nacional de Agricultura Familiar (PRONAF), com taxas de juros que podem variar entre 0,5% a.a. e 5,5% a.a., de acordo com a linha e o valor do financiamento. Outros R$2,9 bilhões virão de outras fontes, com juros de 7,75% a.a. para custeio e 7,5% para o investimento.

As normas a serem aplicadas às operações contratadas no âmbito do PRONAF, ano safra 2015/16, entraram em vigor a partir de 1º de julho de 2015.

O Plano de Safra 2015/16 da Agricultura Familiar salienta, por meio de sua nomenclatura “Alimentos Saudáveis para o Brasil”, o eixo central em torno do qual foram definidas as medidas de atuação política do governo federal. Estas, por sua vez, refletem a manutenção das diretrizes já estabelecidas em planos anteriores e trazem como novidade o aperfeiçoamento de algumas medidas, atendendo à demanda dos agricultores. O plano busca a sustentabilidade com ações que incorporaram preocupações sociais e ambientais, indo, desse modo, além da esfera econômica.

Desde o último censo da agricultura familiar, ocorrido em 2006, essa categoria de trabalhadores passou de 4,3 para 5,1 milhões de pessoas, registrando um aumento de aproximadamente 18%. No decorrer desse período, ocorreu retração no número de agricultores familiares nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, e acréscimos nas regiões Norte (+24%) e Nordeste (+46%) (Tabela 1). Nestas duas últimas predominam módulos fiscais maiores, porém, com baixo padrão tecnológico.

 


 

Nesse sentido, o objetivo do Plano Safra da Agricultura Familiar 2015/16 é a valorização, a consolidação e o fortalecimento dessa categoria produtiva, considerando os diferentes arranjos e regiões em que ela ocorre. São medidas que buscam atender à diversidade da tipologia de agricultores que compõem a categoria “familiar” e promover o desenvolvimento individual, local e regional. As estratégias para esse fim têm sido a diferenciação das taxas de juros e as alterações nas faixas de limite de valor do financiamento em algumas linhas do PRONAF.

 

PRINCIPAIS MEDIDAS

Para a modalidade PRONAF Investimento linhas Eco, Eco Dendê, Eco Seringueira e Mulher, foi introduzida uma faixa intermediária (faixa II), para financiamentos acima de R$10 mil e até R$30 mil, com taxas de juros também intermediárias.

As demais linhas são aquelas destinadas a agroindústria, agroecologia, sistemas agroflorestais, semiárido2, mulher e jovem, que também sofreram acréscimos nas taxas de juros. Para os agricultores de baixa renda, é oferecido o microcrédito rural que permite o financiamento das atividades agropecuárias e não agropecuárias geradoras de renda. Esta linha manteve-se inalterada com relação à safra passada.

No que se refere ao crédito de investimento para agregação de renda, no PRONAF Agroindústria Investimento, as alterações se referem aos encargos financeiros. Para os agricultores ou empreendimentos familiares em operações de até R$10 mil ou, ainda, para cooperativas, com financiamentos de até R$1 milhão, limitados a R$10 mil por associado ativo, a taxa efetiva de juros foi reajustada em 1,5 ponto percentual em relação à safra 2014/15, sendo de 2,5% a.a. em 2015/16. O prazo de reembolso é de até dez anos, incluídos três anos de carência. Na faixa II, para os demais casos, respeitado o limite de R$45 mil por associado quando aplicável, a taxa efetiva de juros foi reajustada em 3,5 pontos percentuais em relação a 2014/15, sendo de 5,5% a.a. em 2015/16. O prazo de reembolso é de até cinco anos, incluído um ano de carência, quando se tratar de caminhonetes de cargas. No caso da linha custeio e comercialização de agroindústrias familiares, a taxa de juros passou também a 5,5% a.a.

O apoio às agroindústrias da agricultura familiar foi dado especialmente pela simplificação das exigências estruturais e burocráticas para o registro sanitário das pequenas agroindústrias3, e para evitar a informalidade de grande parte delas. Assim, o selo do Sistema Federal de Inspeção (SIF), emitido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), deixa de ser um pré-requisito para que o agricultor venda seus produtos a outras unidades da Federação, desde que seu estado esteja incluído no Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (SUASA). As novas medidas incluem os estabelecimentos que produzem bebidas como vinho, cachaça e polpa de frutas4.

Foram anunciadas mudanças positivas no Seguro da Agricultura Familiar (SEAF), já previstas no plano de safra anterior. O valor segurado baseava-se no valor do financiamento, mais 65% da receita líquida esperada, até o limite de R$7 mil. A nova proposta considera 80% da renda bruta esperada até o limite dado pelo financiamento, acrescido de R$20 mil. O valor de adesão é de 3% com bonificação para os que têm menores perdas.

Foi confirmado o repasse de R$236 milhões para a Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (ANATER) para atender mais de 230 mil famílias. Espera-se que essa decisão, juntamente com a nomeação do novo presidente, aumente o apoio aos agricultores.

O governo ampliou o mercado para os produtos da agricultura familiar, ao garantir que pelo menos 30% dos recursos aplicados na aquisição de alimentos por órgãos públicos federais sejam destinados para a compra desses produtores. Será um mercado potencial de R$1,3 bilhão em todo o país. No caso do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), apesar de não terem sido anunciados os volumes de recursos para aquisição, foi facilitada a venda direta de produtos vegetais a escolas e postos de saúde. Há a determinação de que a classificação passará a ser efetuada sem a participação obrigatória do classificador5 de produtos vegetais e poderá ser feita pelo agente público da escola, que deverá, preferencialmente, estar habilitado como classificador.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As ações do Plano de Safra 2015/16 podem ser analisadas a partir do tripé que fundamenta os princípios da modalidade de desenvolvimento econômico qualificado como sustentável.

Sob o aspecto social, os avanços ocorreram: no âmbito do Seguro da Agricultura Familiar (SEAF), com ampliação de benefícios e bônus para aqueles que tiverem menores prejuízos; para os atendidos pelo crédito fundiário, que passarão a ter acesso ao programa “Minha casa, minha vida rural”; nos apoios a empreendimentos de mulheres; na simplificação de acesso ao crédito pelos jovens; e na regularização de territórios quilombolas.

Sob o ponto de vista ambiental, o plano prevê: a ampliação da assistência técnica e da extensão rural, com enfoque na produção sustentável, especialmente a de base agroecológica; o apoio à elaboração do Cadastro Ambiental Rural (CAR); e a extensão para todas as regiões da garantia de preço mínimo para produtos extrativistas.

Já do ponto de vista econômico, o lado positivo abrange as medidas de regulamentação da agroindústria familiar que promove a agregação de valor ao produto primário; a ampliação do mercado de compras institucionais para que, no mínimo, 30% dos alimentos comprados pela administração pública federal venham de agricultores familiares, bem como a elevação de 20% no total de recursos a ser disponibilizado aos produtores, em relação ao ano anterior, por meio do PRONAF.

Ainda que as taxas de juros se mantenham fortemente subsidiadas, quando comparadas com a inflação de 8% verificada nos últimos 12 meses ou com a taxa SELIC (13,5% a.a.), as taxas do PRONAF são maiores que as praticadas na safra 2014/156 (entre 0,5% a.a. e 2% a.a.). Para a região do semiárido, onde as taxas de juros são menores (entre 0,5% e 4,5% a.a.) quando comparadas com outras linhas de financiamento, as taxas chegavam ao máximo de 2% a.a. na safra passada.

Deve-se considerar que a variação dos juros, na maioria das linhas, foi maior do que 100%. Isso pode levar o produtor a não utilizar o crédito, principalmente aqueles de maior prazo de pagamento, bem como à inadimplência. Apesar de que, em geral, para os produtores, seja melhor ter acesso ao crédito mais caro do que não tê-lo. Especialmente o custeio com essas novas taxas será mais difícil de garantir a viabilidade econômica da atividade a ser desenvolvida. Entra então a enorme relevância da Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) para colaborar com o produtor, fazendo um projeto técnico de financiamento que permita estimar se a renda a ser gerada será suficiente para honrar os compromissos, e orientá-lo ao longo da implantação.

O Plano de Safra da Agricultura Familiar 2015/16 não é completo e precisa avançar em pontos fundamentais, como o seguro de renda e o seguro da produção. Seus resultados dependem ainda da execução das medidas e orçamentos. No entanto, no contexto global, pode ser considerado positivo pelas suas propostas, principalmente por considerar a diversidade da tipologia de agricultores que compõem a “agricultura familiar” nacional e manter as diretrizes para o seu desenvolvimento, justificando a necessidade da construção de um plano plurianual que lhes dê maior estabilidade e previsibilidade econômica.

 

 1ANANIAS, P. Espaços de vida. Folha de S. Paulo, São Paulo, 22 jun. 2015. Disponível em: <htpp://

www.mda.gov.br/sitemda/sites/sitemda/files/user_arquivos_383/espacos-de-vida_patrus-ananias_20150618
_DISTRIBUICAO_3.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2015.

 2O clima semiárido está presente no Brasil nas regiões Nordeste e Sudeste (norte de Minas Gerais). A área do semiárido corresponde a aproximadamente 11% do território brasileiro.

 3BRASIL. Decreto n. 8.471, de 22 de junho de 2015. Altera o Anexo ao Decreto n. 5.741, de 30 de março de 2006, que regulamenta os arts. 27-A, 28-A e 29-A da Lei n. 8.171, de 17 de janeiro de 1991, e organiza o Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária Regulamentação. Diário Oficial da União, 23 jun. 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Decreto/D8471.htm>. Acesso em: jul. 2015.

 4MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA. Mapa institui normas mais flexíveis para pequena agroindústria. Brasília: MAPA, 20015. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/comunicacao

/noticias/2015/06/mapa-institui-normas-mais-flexiveis-para-pequena-agroindustria>. Acesso em: 10 jan. 2015.

 5São técnicos com formação na área agronômica, dentre eles, engenheiros agrônomos, engenheiros agrícolas e técnicos agrícolas, que participam de cursos aprovados pelo MAPA e são capacitados e habilitados para realizar a classificação de produtos vegetais.

 6Serão mantidas as taxas do microcrédito rural e dos créditos de estruturação produtiva na reforma agrária.

 

 Palavras-chave: plano de safra, agricultura familiar, crédito rural.



Data de Publicação: 23/07/2015

Autor(es): Terezinha Joyce Fernandes Franca (terezinha.franca@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Silene Maria de Freitas (silene.freitas@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Samira Aoun (samira@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor