Os Alimentos Orgânicos mais Baratos: estudo preliminar sobre a venda direta feita pelos produtores


 

A maioria das pessoas não come alimentos orgânicos porque já se acostumaram a encontrá-los sempre mais caros nas gôndolas e prateleiras dos supermercados. Na busca de compreender esse importante mercado rumo à transição ecológica, grupos de consumo consciente reunidos em instituições, como a Kairós1, realizaram na última década importantes estudos de caso sobre os canais de comercialização de alimentos orgânicos em algumas capitais dos principais estados brasileiros e alguns municípios do interior do Brasil. Apresentaram abordagens que demonstraram as diferenças entre os preços nos supermercados e os praticados nas cestas de venda direta feita pelos produtores.

Para aprofundar o acompanhamento dessa temática, o Instituto de Economia Agrícola (IEA) da Secretaria da Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo (SAA/SP), por meio de sua rotina de levantamento estatístico dos preços recebidos pelos produtores paulistas, vêm introduzindo estudos experimentais no segmento dos alimentos orgânicos. Incentivados pelo lançamento do Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica
(PLEAPO), além da introdução gradual de produtos orgânicos no seu levantamento oficial de preços de alimentos, realizou-se durante o ano de 2022 um experimento no Oeste Paulista (centralizado na cidade média de Araçatuba), quando foram mapeados os canais de comercialização dos produtos orgânicos in natura produzidos na região. Pretendeu-se com esse estudo preliminar comparar os preços nesses diferentes fluxos desse segmento de alimentos.

Após a identificação da produção certificada para o cultivo de alimentos orgânicos na lista de produtores presentes no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), do governo federal, definiu-se em reuniões online (5 reuniões individuais com cada produtor e 2 coletivas com a presença de 3 consumidores das cestas de venda direta) realizadas no 1º semestre de 2022 (entre autores do estudo, produtores e consumidores da região pesquisada) uma amostra para a realização da análise dos preços comparativos de canais de venda direta (cesta de 5 produtores para grupos de consumo, via negociação online e entrega domiciliar) e 4 supermercados. Após a aplicação de um primeiro questionário eletrônico piloto (por 3 consumidores das cestas e 1 pesquisador científico) com os produtores regionais e nos supermercados (Figuras 1 e 2) em agosto de 2022 (seguindo a proposta de aplicação de metodologia participativa com grupo de consumo)2, no mês subsequente (setembro de 2022) foi realizado um levantamento completo (com ajustes nas variáveis a partir do piloto aplicado no mês anterior - para variedades, unidades de comercialização, conversão de unidades para kg) que apontou resultados importantes para entendermos melhor esse emergente mercado3. Para comparação, foram usados os preços recebidos pelos produtos convencionais do levantamento experimental realizado pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI) e o IEA.

 

Como resultado dessa análise temos as seguintes considerações:

a)  Os preços recebidos pelos produtores de orgânicos na região de Araçatuba foram, em média, 330,27% maiores do que os valores dos convencionais. Nenhum alimento orgânico produzido pelos agricultores pesquisados apresentou preço menor que o recebido pelos produtores convencionais (Figura 3). Verifica-se que essa diferença se justifica pelo fato de que a produção de orgânicos investigada funciona via venda direta, com a ausência de atravessadores, o que garante a posse desses agricultores daquilo que costuma ser absorvido por atacadistas e varejistas pelos produtores convencionais (Figura 3).

b) Corroborando essa verificação, quando comparados os preços pagos pelos consumidores de orgânicos, os praticados nos quatro supermercados apresentaram um valor, em média, 129,00% maior que o oferecido nos canais de comercialização de venda direta de cestas dos produtores de orgânicos. Somente almeirão (-46%) e couve (-17%) estiveram com preços menores nos mercados em relação às cestas dos produtores orgânicos (Figura 4). Como os preços praticados pelos supermercados agregam os seus lucros e os dos atravessadores atacadistas, as margens de comercialização entre o produtor e o consumidor elevam os preços do produto final.

 

c) Sendo assim, quando comparados os preços pagos pelos consumidores de orgânicos e convencionais nos mercados, os preços dos produtos orgânicos apresentaram um valor, em média, 184,44% maior que os preços dos produtos convencionais. Dentre alguns dos produtos comparados, somente o tomatinho grape orgânico apareceu mais barato que o convencional nos mercados pesquisados na região (Figura 5). 

 

 

d) Contudo, ao separarmos os preços dos produtos orgânicos no canal de comercialização de venda direta da cestas dos produtores, diminui-se essa diferença com os convencionais nos supermercados: os preços ficam, em média, 63,91% maior que os dos produtos convencionais nos supermercados, o que demonstra uma diferença quase 3 vezes menor que os orgânicos vendidos nos supermercados. No comparativo, produtos orgânicos como a alface americana (-16%), alface crespa (-52%), brócolis-ninja (-31%), couve-flor (-61%), pepino japonês (-13%), quiabo (-38%), tomatinho grape (-36%) e mamão formosa (-47%) estiveram mais baratos que os similares convencionais vendidos nos mercados pesquisados (Figura 6).

 

Como considerações desse estudo experimental, verifica-se que os preços de orgânicos continuam mais caros que os convencionais, o que limita sua capacidade de popularização. Contudo, quando o alimento é produzido na região, a possibilidade de venda direta diminui a diferença entre os preços dos produtos orgânicos e convencionais (Figura 7). Afora a precificação monetária, a diversidade de produtos da cesta de alimentos orgânicos atinge variedades que estão fora de oferta nos canais de comercialização convencionais: produtos não convencionais (PANCs) como ora-pro-nóbis, peixinho da horta e taioba (dentre outros), retiram a monotonia do cardápio em relação ao oferecido somente pelo supermercado, aproximando a população urbana do entorno rural em suas regiões.

 

Na continuidade dessa pesquisa sobre preços de alimentos orgânicos in natura, tendo como referência o mesmo recorte territorial no Oeste Paulista, pretende-se encaminhar:

a) a confecção de projeto para planejar sua execução em 2023 no Sistema de Gestão de Projetos da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA);

b) a realização de 4 levantamentos em 2023 (nas diferentes estações e ciclos) para verificação da variação dos preços e suas sazonalidades; e

c) a padronização da pesagem de folhosas em quilogramas (para os produtores e o varejo).


 

1RETIÈRE, M. Alimentos sem veneno são sempre mais caros? Uma pesquisa da Rede Brasileira de Grupos de Consumo Responsável. In: GONÇALVES & MASCARENHAS (Org.). Instituto Kairós. São Paulo, 2017.

 2 Op. cit. nota 1.

 3Nesta pesquisa, baseada na oferta disponibilizada pelos produtores de orgânicos regionais, foram investigados os preços dos seguintes alimentos: alface americana, alface crespa, alface lisa, alface mimosa, alface romana, almeirão, cheiro verde, chicória, couve, escarola, espinafre, rúcula, salsa, beterraba, cebola, cenoura, inhame, gengibre, mandioca, mandioquinha, nabo, rabanete, abóbora (brasileira, moranga e paulistinha), abobrinha (italiana e menina), batata doce, berinjela, brócolis ninja, brócolis ramoso, café torrado, cará, chuchu, couve-flor, ervilha, feijão, jiló, milho verde, pepino (caipira e japonês), pimentão (amarelo, verde e vermelho), quiabo, repolho (verde e roxo), tomate (cereja, italiano e rasteiro),  alho-poró, cebolinha, coentro, hortelã, manjericão, orégano, pimentas, salsinha, abacate, abacaxi (havaí e pérola), acerola, banana (nanica, prata, da terra, maçã), coco verde, laranja (baía, lima e pera), limão (galego, cravo, taiti), mamão (formosa e papaia), manga (palmer, tommy), maracujá, melancia, melão (amarelo, sapo, cantaloupe), pinha e tangerina.

 

Palavras-chave: preços, comercialização, alimento orgânico.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

BINI, D. L de C; NAKAMA, L. M. Os Alimentos Orgânicos mais Baratos: estudo preliminar sobre a venda direta feita pelos produtores. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 18, n. 3, p. 1-8, mar. 2023. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 10/03/2023

Autor(es): Danton Leonel de Camargo Bini (danton.camargo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Leonardo Massao Nakama Consulte outros textos deste autor