Mudanças na Composição Agropecuária e Florestal Paulista, 1999 e 2008

(1)

            A agricultura paulista apresentou modificações consideráveis na ocupação do uso do solo nos últimos dez anos. Mesmo com a modernização registrada desde a década de 1970 na agropecuária do Estado do São Paulo e do Brasil, em terras bandeirantes, em 1999 aproximadamente a metade da área rural ainda se direcionava para as pastagens (Tabela 1)2. Associadas ao período de crescimento econômico mundial com a intensificação do comércio entre os países, do desenvolvimento do uso da bioenergia - principalmente com a produção de etanol como fonte alternativa em substituição aos derivados de petróleo – e, também, com a modernização e uso de novas tecnologias na condução das culturas, alterações quantitativas e qualitativas constituíram novos arranjos ao espaço agropecuário paulista no findar da primeira década dos anos 2000.

            Este estudo tem por objetivo mostrar como eram destinadas as áreas com as atividades agroflorestais no ano de 1999 e como terminaram o ano de 2008. Para tanto partiu-se das séries históricas das áreas ocupadas com produtos de origem vegetal (incluindo silvicultura) e pastagens no Estado de São Paulo, no período de 1999 até 2008, provenientes dos levantamentos realizados pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA) e pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), agregadas em 6 grupos: culturas anuais, culturas semi-perenes, culturas perenes, pastagens, reflorestamento e vegetação natural.

            Na visualização da figura 1 ficam evidentes as principais modificações no conteúdo da ocupação do solo. Adentrando os anos 2000 em um ciclo de desvalorização do valor da carne bovina, o setor pecuário se desfez de parte considerável de seu rebanho (com o aumento do coeficiente de abate de matrizes), deslocando um maior percentual de suas atividades para terras mais baratas, fora da delimitação territorial do estado de São Paulo. Dessa forma, a área destinada para pastagens apresenta recuo da ordem de 1,8 milhão de hectares no período, diminuindo assim sua participação no total da área rural do Estado de São Paulo de 49,8% em 1999 para 38,2% em 2008. A cessão de área se deu, principalmente, para a cana-de-açúcar, porém em grandezas diferentes no espaço paulista3 (Tabela 1).

Tabela 1 - Distribuição das Atividades Agropecuárias no Espaço Geográfico Paulista, Anos de 1999 e 2008

Produto/grupo
1999
2008
Variação (%) 2008/1999
Área 
(ha) 
Participação (%) 
 
Área 
(ha) 
Participação (%) 
Milho
1.125.787
5,5
935.114
4,2
-16,9
Soja
516.247
2,5
456.219
2,1
-11,6
Feijão
255.497
1,2
169.346
0,8
-33,7
Amendoim
75.982
0,4
78.383
0,4
3,2
Trigo
19.240
0,1
71.934
0,3
273,9
Sorgo
51.340
0,2
49.050
0,2
-4,5
Milho silagem
92.874
0,5
33.405
0,2
-64,0
Batata
31.367
0,2
29.305
0,1
-6,6
Algodão
71.824
0,3
22.779
0,1
-68,3
Arroz
58.145
0,3
20.606
0,1
-64,6
Tomate
13.045
0,1
11.472
0,1
-12,1
Cebola
11.289
0,1
5.559
0,0
-50,8
Outras anuais
115.776
0,6
127.733
0,6
10,3
Anual
2.438.413
11,8
 
2.010.906
9,1
-17,5
Cana p/indústria
2.756.341
13,4
5.411.303
24,6
96,3
Cana forragem
82.923
0,4
87.014
0,4
4,9
Mandioca
49.988
0,2
61.264
0,3
22,6
Outras semiperene 
11.387
0,1
14.703
0,1
29,1
Semi-perene
2.900.639
14,1
 
5.574.283
25,3
92,2
Laranja
713.477
3,5
723.420
3,3
1,4
Café
245.149
1,2
223.856
1,0
-8,7
Seringueira
35.498
0,2
62.738
0,3
76,7
Banana
58.665
0,3
61.269
0,3
4,4
Limão
33.000
0,2
32.032
0,1
-2,9
Manga
30.813
0,1
25.668
0,1
-16,7
Uva para mesa
10.962
0,1
9.615
0,0
-12,3
Poncã
16.930
0,1
9.564
0,0
-43,5
Outros citros
10.453
0,1
9.397
0,0
-10,1
Goiaba
5.446
0,0
5.259
0,0
-3,4
Outras perenes
34.087
0,2
26.533
0,1
-22,2
Perene
1.194.480
5,8
 
1.189.351
5,4
-0,4
Pastagem
10.250.547
49,8
8.417.897
38,2
-17,9
Pastagem
10.250.547
49,8
 
8.417.897
38,2
-17,9
Eucalipto
708.321
3,4
1.001.076
4,5
41,3
Pinus
159.238
0,8
172.477
0,8
8,3
Kiri
593
0,0
925
0,0
56,0
Reflorestamento
868.152
4,2
 
1.174.478
5,3
35,3
Mata natural
2.468.289
12,0
3.121.281
14,2
26,5
Cerrado
244.101
1,2
290.952
1,3
19,2
Cerradão
218.252
1,1
241.053
1,1
10,4
Veg. natural
2.930.642
14,2
 
3.653.286
16,6
24,7
Total geral
20.582.872
100,0
 
22.020.200
100,0
7,0
Fonte: Dados da pesquisa.
 

Figura 1 - Ocupação do Solo do Estado de São Paulo, Anos de 1999 e 2008. 

Fonte: Elaborada pelos autores, a partir de dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA) e CATI.

            No grupo das culturas semi-perenes, destaca-se a cana-de-açúcar, que apresentou avanço na ocupação do solo estadual, incorporando áreas destinadas anteriormente a outras culturas, principalmente áreas de pastagens e culturas anuais. Com o aumento do uso do álcool combustível na frota nacional e as expectativas de sua exportação em grande volume (com o apontamento de sua introdução no mercado de commodities), muitos produtores – principalmente tradicionais pecuaristas - arrendaram áreas agriculturáveis para usinas de açúcar e álcool estimulados pelo adiantamento de parte do valor do arrendamento (fixados em ATR), ficando, às vezes, a cargo das usinas a condução do plantio, dos tratos culturais e da colheita. Com esse cenário, a área plantada com a cana aumentou mais de 2,65 milhões de hectares entre os anos de 1999 e 2008 e, consequentemente, sua participação no total da área rural paulista cresceu significativamente de 13,4% para 24,6%.

            O percentual de área correspondente ao grupo de culturas anuais diminuiu 17,5% - em torno de 420 mil hectares deixando de atuar nesse conjunto de culturas – mantendo nas culturas de milho, soja e feijão as principais atividades tanto em 1999 quanto em 2008. Mesmo com essa redução de área, que reforça a disputa de terras entre energia e alimentos, foram os ganhos de produtividade que elevaram a produção paulista de grãos, devido ao uso de sementes melhoradas, da modernização e tecnificação por parte dos produtores4.

            As áreas com as culturas perenes se mantiveram praticamente inalteradas no período (-0,4%), ocorrendo expansões de área de laranja (1,4%), banana (4,4%) e, excepcionalmente, de seringueira (76,7%). As demais culturas, pertencentes a esse grupo reduziram a área plantada, entretanto os resultados devem ser vistos com cautela, pois, no período em estudo, houve adensamento do número de pés por área, significando que nem sempre a perda de área provoca diminuição no número de pés5.

            As ocupações das áreas de vegetação natural e de reflorestamento, a partir do cumprimento de metas estruturadas no tripé da sustentabilidade – como as propostas no Plano de Desenvolvimento Florestal Sustentável (PDFS)6 - e do crescimento do setor industrial de celulose (atividade rentável que estimulou a plantação de espécies economicamente viáveis), estão entre as atividades que mais sedimentaram seus espaços na economia agrícola paulista: hoje, o reflorestamento é o segundo item no valor da produção da agropecuária paulista7, atrás somente da cana-de-açúcar. A área ocupada com eucalipto cresceu 41,33% no período considerado, passando de cerca de 700 mil ha para mais de 1 milhão de ha em todo o Estado.

            As mudanças no uso do solo paulista comprovam que as atividades agroflorestais, dadas as condições de mercado e incentivos governamentais, realizam ajustes por meio de um processo bastante dinâmico.

___________________________
1Cadastrado no SIGA, NRP 1914.

2Apresentando uma relação de 1,25 cabeças de bovinos por hectare, a pecuária paulista alimentava ainda no findar do século XX um retrato de pouca produtividade, característica de uma atividade prioritariamente executora de especulação imobiliária. Ver: REYDON, B. P. A propriedade da terra agrícola em São Paulo: características recentes. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.7, n. 2p. 39-50, jul./set., 1993.

3Ver em: INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA - IEA. Banco de dados. Disponível em: <http://www.iea.sp. gov.br/out/banco/menu.php>. Acesso em: fev. 2010.

4Para maiores detalhes, ver: CAMARGO, A. M. M. P. et al. Dinâmica e Tendência da expansão da cana-de-açúcar sobre as demais atividades agropecuárias, Estado de São Paulo, 2001-2006 Informações Econômicas, São Paulo, v. 38, n. 3, p. 47-61, mar. 2008 e OLIVETTE, M. P. A., NACHILUK, K., FRANCISCO, V. L. F. S. Análise comparativa da área plantada com cana-de-açúcar frente aos principais grupos de culturas nos municípios paulistas, 1996-2008 Informações Econômicas, São Paulo, v. 40, n. 2, p. 42-59, fev. 2010.

5Op. cit. nota 2.

6CASER, D.V. et al. Densidade de cultivo de laranja, banana, café e uva no estado de São Paulo Informações Econômicas, São Paulo, v. 23, n. 6, p. 09-11, jun. 1993.

7CASTANHO FILHO, E. P. Cobertura florestal e considerações de política florestal Informações Econômicas, São Paulo, v. 39, n. 7, p. 05-09, julho. 2009.

8TSUNECHIRO, A. et al. Valor da produção agropecuária e florestal do Estado de São Paulo em 2009: estimativa preliminar. Informações Econômicas, São Paulo, v. 39, n.10, p. 83-95, out. 2009.

Palavras-chave: ocupação de solo, uso do solo, agropecuária paulista, distribuição de áreas.

Data de Publicação: 11/03/2010

Autor(es): José Alberto Angelo (jose.angelo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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