Mudanças Recentes na Geografia da Pecuária Bovina de Corte

 A expansão da produção canavieira no Estado de São Paulo tem a colocado como a de maior valor econômico na atividade agropecuária recente1, o que desbancou da liderança a pecuária bovina de corte enquanto principal atividade da economia agrícola paulista. Nesta alteração da composição agropecuária, novos conteúdos são instalados no espaço geográfico paulista. Exemplo são os confinamentos de engorda bovina que, constituídos por um conjunto de técnicas que intensificam o uso das propriedades rurais, mesmo ao apresentarem barreiras à entrada devido ao aumento dos custos de produção em relação à engorda tradicional à pasto2, têm sido utilizados pelos pecuaristas desde a década de 1980, quando da ocupação das áreas extensivas de pastagens por canaviais. Contudo, o menor custo para a execução da transferência do ciclo pecuário (cria, recria e em menor escala a engorda) para áreas mais baratas no Centro-Oeste e Norte do país3 desmotivou a introdução destas técnicas de acabamento bovino via confinamentos durante os últimos 30 anos.

A partir das políticas agroambientais desenvolvidas e implementadas nas diferentes esferas governamentais com maior rigor nesta primeira década dos anos 2000 - como o Programa Nacional de Florestas (PNF) -, a ocupação de novas áreas margeando a floresta amazônica se coloca como algo insustentável4. Daí que o setor pecuário nacional, por meio de investimentos em pesquisa e inovação, tem atuado no intuito da modernização da atividade, com a criação de redes de associações de produtores, universidades e institutos de pesquisas ligadas à introdução cada vez mais densa de ciência, tecnologia e inovação no cotidiano do setor. Matrizes e reprodutores de linhagens melhoradas, manejo de pastagens mais produtivas, intensificação via confinamentos são aplicações que dia-a-dia se tornam mais presentes, fruto das demandas do setor e das políticas públicas e privadas em pesquisa científica5.

Para a compreensão desse processo soma-se a reestruturação produtiva da economia gerada principalmente pelas reformas de atuação do Estado que, desde os anos 1990 (com a criação das agências autorregulatórias), leva o circuito espacial de produção da carne bovina ao maior uso de inovações. Reflexo disso são as melhorias nos equipamentos de refrigeração e transporte de carnes que capacitou ao estiramento das distâncias entre o abate e o consumo de seus produtos. Também as disputas de rentabilidade entre as atividades agropecuárias nas terras mais caras do centro-sul acentuaram o deslocamento das áreas de engorda e dos frigoríficos para regiões de terras baratas em terrenos do Norte e Centro-Oeste do país.

Assim, naquilo que se considera Amazônia Legal, a partir dos dados dos Censos Agropecuários de 1996 e 2006 e da Pesquisa Pecuária Municipal publicada em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)6, obteve-se no intervalo de 14 anos (1996-2010) um reajuste de 116,4% no número de bovinos alocados (Tabela 1)7.

 

No centro-sul, após uma ascensão de sua boiada entre 1996 e 2006, fruto da expansão dos rebanhos de Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, a segunda metade da primeira década dos anos 2000, principalmente pela ocupação das pastagens pela cana--de-açúcar (com maior intensidade no Estado de São Paulo) apresentou um declínio no número de animais (Tabela 1). Visualizando esse movimento da pecuária bovina de corte na mudança da geografia brasileira, vê-se que a ocupação das pastagens entre os Censos Agropecuários de 1985 e 20068 apresentou uma diminuição de um pouco menos que 10% no território nacional (Tabela 2). Positivo seria – pois representaria uma intensificação da atividade – se esta diminuição fosse absoluta em todas as regiões do país. Contudo, essa mudança na geografia da pecuária bovina de corte brasileira rumo aos terrenos baratos nas bordas da Amazônia Legal tem acarretado uma visibilidade negativa do circuito espacial de produção pecuário nacional.

Assim, este alargamento da ocupação da atividade pecuária nestas regiões de fronteira se revelou pouco produtivo. Mesmo com as boas experiências de intensificação via confinamentos e renovação de pastagens em todas as regiões do Brasil terem aumentado percentualmente a lotação média da pecuária bovina nacional (Tabela 3), estes mesmos números, ao indicarem pouco mais que um animal por hectare, demonstram uma realidade majoritariamente de subocupação da terra diante do arcabouço técnico--científico disponível para a modernização da atividade.  

 

 

No centro-sul, onde a cana-de-açúcar apresentou sua maior expansão no território nacional, todos os Estados apresentaram redução de pastagens. Destaque se dá para São Paulo, especificamente em sua porção ocidental.

Dos 1.528.879 animais a menos presente no espaço geográfico paulista, 65% foram reduções nas boiadas do oeste paulista (Figura 1 e Tabela 4). No que se refere à redução de áreas, a mesma região se destaca, posicionando-se como lócus de mais da metade da redução dos pastos paulistas (Tabela 5).

Neste processo de transformações, intensificou-se a atividade no Estado de São Paulo, com o aumento da lotação animal por hectare. Destaque novamente deve ser dado para as regiões de pecuária de corte no oeste (Tabela 6), que concentram 60% dos animais em confinamento em território paulista9 (Tabela 7).

Mesmo diante deste panorama de modernização, torna-se importante frisar que estes fluxos baseados em intensificação do acabamento de bovinos continua sendo apontamento minoritário da atividade pecuária de corte: um pouco mais de 500 mil animais num universo de aproximadamente 10 milhões de bovinos direcionado para o abate corresponde a somente 5% da totalidade do setor na região. Ou seja, mantém-se como hegemônico no uso do espaço rural paulista (mesmo depois de uma década de grande expansão dos canaviais) uma pecuária extensiva ainda pouco moderna.

 


  


 

Data de Publicação: 03/06/2013

Autor(es): Danton Leonel de Camargo Bini (danton.camargo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor