Artigos
Custo de Formação, Produção e Rentabilidade da Cultura da Seringueira, Estado de São Paulo, 2017
A cultura da seringueira ganhou importância no
Brasil na década de 1970 principalmente pela política governamental de estímulo
a novos plantios e dos elevados preços recebidos pelos produtores. Em São Paulo
ganhou importância no início dos anos 1980 como alternativa econômica para os
empresários paulistas com apoio dos órgãos de pesquisa e extensão rural do
Estado2. De acordo com do Instituto de Economia Agrícola (IEA)3,
ocupa área de 111,05 mil hectares e produção de 180,89 mil toneladas de
coágulo. São Paulo é o maior Estado produtor brasileiro, com 60% da produção
nacional4.
A atividade ocupa a 21ª posição no Valor da Produção
Agropecuária (VPA) paulista, com valor de R$390,1 mil em 2016, com incremento
de 18,4% em relação ao ano anterior5. De acordo com os autores, o
preço médio recebido pelos produtores do estado em 2016 foi de R$2,16 por kg de
coágulo.
Dados estatísticos e análises econômicas realizadas
especificamente para as atividades agrícolas contribuem para a compreensão da
dinâmica da produção e para a tomada de decisão acerca de sua gestão. Nesse sentido,
este artigo objetiva apresentar estimativas de custos de formação e plena
atividade da cultura da seringueira no Estado de São Paulo, e apresentar uma
análise de resultados econômicos em função dos custos de produção, preços
recebidos pelos produtores e diferentes níveis de produtividade.
A metodologia de custo de produção utilizada é
baseada em Martin et al. (1998)6. Sua concepção é de curto prazo,
sendo que as remunerações do capital, terra e empresário não são computadas,
supondo-se que isso se fará pela renda líquida. A estrutura de custos do
sistema é a de custo operacional do IEA7 e composta de: a) custo
operacional efetivo (COE) - despesas efetuadas com mão de obra, encargos
sociais (40% sobre o valor da despesa com mão de obra), operações de máquinas/equipamentos,
veículos e materiais consumidos ao longo do ciclo da cultura; e b) custo
operacional total (COT) - o COE acrescido da contribuição à seguridade social
rural, CSSR (2,3% do valor da renda bruta), depreciação de máquinas e do
seringal, encargos financeiros que se referem aos juros de custeio à taxa de
8,75% a.a. sobre o COE, e despesas com serviços de assistência técnica. Os
indicadores de análise de resultados utilizados são os seguintes: receita bruta
(RB) é a produção x preço; margem bruta (MB) é a receita bruta/custos, em
percentagem; ponto de equilíbrio (PE) é a produção necessária para remunerar os
custos; lucro operacional (LO) é a receita bruta menos o COT; e índice de
lucratividade (IL) é a relação percentual entre LO e MB.
As matrizes de coeficientes técnicos de fatores de
produção referem-se a uma propriedade padrão composta da seguinte maneira: área
plantada de 50 hectares, clone RRIM 600, espaçamento de 2,5 x 8 m, 20 m2/planta,
500 pés plantados, 400 em produção, 25 anos de idade do seringal (para o
seringal em plena produção), sistema de sangria D4, produtividade de 7 kg de
coágulo/planta, 2.800 kg de coágulo/hectare, e ano agrícola set./ago.8.
Os preços dos fatores de produção, que foram coletados na região produtora, e
os preços recebidos pelo produtor referem-se ao do mês de fevereiro de 2017.
A
atividade da seringueira, constituída da fase de implantação (primeiro ano) e
seguida como fase de formação até o sexto ano, apresenta produção de borracha a
partir do sétimo ano, quando 50% das plantas entram em sangria; a partir do
décimo ano, considera-se que o seringal tenha 100% de suas árvores em sangria.
O custo de implantação, ou seja, o primeiro ano da
cultura, é o de maior valor, pois são consideradas as operações como o preparo
do solo, plantio, replantio, molhação e outras operações de instalação da
cultura (Tabela 1). Este custo apresenta valor de R$15.022,12 para o COE e
R$17.015,53 para COT. O custo de implantação até o sexto ano é de R$22.740,18
para o COE, enquanto o do COT é de R$26.867,74. Nos anos subsequentes (segundo
ao sexto anos), o custo apresenta valores menores em relação ao primeiro ano
por apresentar operações de manejo sem sofrer o impacto dos custos com
operações de máquinas ocorridos em sua implantação.
A partir do sétimo ano, inicia-se a sangria e os
custos de produção têm um aumento, principalmente, pelo impacto da aquisição
dos materiais para a sangria e do uso da mão de obra do sangrador. A partir do
décimo ano, o seringal entra em plena produção com 100% das árvores em sangria,
tendendo à estabilização da produção.
Considerando-se o seringal adulto em plena produção,
calculou-se o custo de produção para análise de seus resultados econômicos (Tabela
2). O COE para o quilograma de coágulo foi estimado em R$2,86 (R$8.007,55/ha) e o COT
atingiu o valor de R$9.541,16/ha ou R$3,41 por kg de coágulo.
O item de maior participação percentual no custo de
produção (COT) é o da mão de obra, que soma 41,4% (comum, sangria e
tratorista), seguido dos custos dos encargos sociais (16,6%), operações com
defensivos (8,0%), máquinas (5,6%) e adubos (4,1%).
Tabela 1 - Valores do COE
e do COT nos Custos de Formação da Cultura da Seringueira, Sistema D4, por Hectare, Região de São José do Rio Preto, Estado de São Paulo,
em R$ de Fevereiro de 2017
Ano da formação |
Custo operacional efetivo |
Custo operacional total |
Implantação |
15.022,12 |
17.015,53 |
2º |
1.706,19 |
2.157,32 |
3º |
1.998,50 |
2.468,81 |
4º |
1.015,81 |
1.439,06 |
5º |
1.861,31 |
2.293,59 |
6º |
1.136,26 |
1.493,42 |
Custo de implantação |
22.740,18 |
26.867,74 |
7º |
8.264,60 |
9.611,48 |
8º |
7.903,57 |
9.233,08 |
9º |
8.952,90 |
10.329,42 |
10º |
9.218,09 |
10.593,60 |
Total |
57.079,34 |
66.635,32 |
Fonte: Dados da pesquisa.
Tabela
2 - Participação Percentual dos Itens Componentes
do Custo de Produção para a Cultura da Seringueira, Sistema de Produção D4,
Produção de 2.800 kg de Coá-
gulo por Hectare, Região de São José do Rio Preto, Estado de São Paulo, em R$
de Fevereiro de 2017
Item |
Valor (R$) |
COE (%) |
COT (%) |
kg de coágulo (custo) |
Mão de obra comum |
1.194,43 |
14,9 |
12,52 |
0,43 |
Mão de obra sangria |
2.551,80 |
31,9 |
26,75 |
0,91 |
Mão de obra tratorista |
207,88 |
2,6 |
2,18 |
0,07 |
Operação de máquinas |
529,58 |
6,6 |
5,55 |
0,19 |
Adubo |
386,92 |
4,8 |
4,06 |
0,14 |
Defensivos |
766,85 |
9,6 |
8,04 |
0,27 |
Materiais |
174,07 |
2,2 |
1,82 |
0,06 |
Encargos Sociais |
1.581,64 |
19,8 |
16,58 |
0,56 |
Transporte de pessoal |
614,37 |
7,7 |
6,44 |
0,22 |
Custo operacional efetivo |
8.007,55 |
100 |
|
2,86 |
Depreciação de máquinas |
128,44 |
1,35 |
0,05 |
|
Depreciação do seringal |
668,83 |
7,01 |
0,24 |
|
CSSR |
206,08 |
2,16 |
0,07 |
|
Assistência técnica |
250,00 |
2,62 |
0,09 |
|
Encargos financeiros |
280,26 |
2,94 |
0,10 |
|
Custo operacional total |
9.541,16 |
|
100 |
3,41 |
Fonte: Dados da pesquisa.
A análise dos itens de participação
percentual dos componentes do custo de produção permite em primeira análise
visualizar quais os principais deles que impactam as despesas com a produção.
Conhecendo
os itens que mais oneram os custos, pode-se, a partir dessas informações,
exercer maior controle em seu uso e determinar prioridades em sua gestão. No
caso da seringueira, observa-se que as atividades de mão de obra, associadas
aos encargos sociais, representam 69,2% do COE, e que, ao somar o custo com
transporte de pessoal (que também está associado ao uso da mão de obra), atinge-se
76,9% do COE, incorrendo nesse fator de produção o maior impacto nos custos de
produção de borracha.
Quando avaliado em relação às
despesas totais, esse percentual aponta 64,4% do COT, corroborando o impacto do
item nas despesas com a produção,
Nas tabelas 3, 4 e 5 estão
discriminados os valores recebidos pela produção.
Tabela 3 - Indicadores de Rentabilidade
para a Cultura de Seringueira, Produtividade de 2.200 kg de Coágulo por Hectare
e Dois Tipos de Preços Recebidos pelo Produtor, Estado de São Paulo, Fevereiro de 2017
Indicador |
Unidade |
Produção de 2.200 kg de coágulo |
|
Mínimo R$2,00 |
IEA fev./2017 R$3,20 |
||
Receita bruta
|
R$/ha |
4.400,00 |
7.040,00 |
Margem bruta (COE)
|
% |
-44,9 |
-11,8 |
Margem bruta (COT)
|
% |
-53,4 |
-25,4 |
Ponto de equilíbrio (COE)
|
kg |
3.992 |
2.495 |
Ponto de equilíbrio (COT)
|
kg |
4.721 |
2.951 |
Lucro operacional
|
R$ |
-5.042,85 |
-2.402,85 |
Índice de lucratividade
|
% |
-114,6 |
-34,1 |
Fonte: Dados da pesquisa.
Tabela 4 - Indicadores de
Rentabilidade para a Cultura de Seringueira, Produtividade de 2.800 kg de Coágulo
por Hectare e Dois Tipos de Preços Recebidos pelo Produtor, Estado de São
Paulo, Fevereiro de 2017
Indicador |
Unidade |
Produção de 2.800 kg de coágulo |
|
Mínimo R$2,00 |
IEA fev./2017 R$3,20 |
||
Receita bruta
|
R$/ha |
5.600,00 |
8.960,00 |
Margem bruta (COE)
|
% |
-29,9 |
12,2 |
Margem bruta (COT)
|
% |
-40,7 |
-5,1 |
Ponto de equilíbrio (COE)
|
kg |
3.992 |
2.495 |
Ponto de equilíbrio (COT)
|
kg |
4.721 |
2.951 |
Lucro operacional
|
R$ |
-3842,85 |
-482,85 |
Índice de lucratividade
|
% |
-68,6 |
-5,4 |
Fonte: Dados da pesquisa.
Tabela 5 - Indicadores de Rentabilidade
para a Cultura de Seringueira, Produtividade de 3.200 kg de Coágulo por Hectare
e Dois Tipos de Preços Recebidos pelo Produtor, Estado de São Paulo, Fevereiro de 2017
Indicador |
Unidade |
Produção de 3.200 kg de coágulo |
|
Mínimo R$2,00 |
IEA fev./2017 R$3,20 |
||
Receita bruta
|
R$/ha |
6.400,00 |
10.240,00 |
Margem bruta (COE)
|
% |
-19,8 |
28,3 |
Margem bruta (COT)
|
% |
-32,2 |
8,4 |
Ponto de equilíbrio (COE)
|
kg |
3.992 |
2.495 |
Ponto de equilíbrio (COT)
|
kg |
4.721 |
2.951 |
Lucro operacional
|
R$ |
-3042,85 |
797,15 |
Índice de lucratividade
|
% |
-47,5 |
7,8 |
Fonte: Dados da pesquisa.
A
receita bruta estimada em função de preços médios recebidos pelos produtores de
borracha do Estado de São Paulo publicados pelo IEA e o preço mínimo do governo
federal apresentam margem bruta negativa para os níveis de produtividade de
2.200 e 2.800 kg de coágulo por hectare (Tabelas 3 e 4). O ponto de equilíbrio
que representa o nível de produção em que a receita é igual ao custo também não
apresenta produção suficiente para remunerar os custos, tanto em nível de COE quanto
no COT, o que resultou em lucro operacional negativo, não remunerando, portanto,
os custos de produção aqui estimados.
Além
dos custos aqui calculados, existem outros que dependem da renda líquida para
serem remunerados: o capital e a terra, e o pró-labore do empresário. Assim,
nesses dois casos, a produção avaliada apresenta-se inviável em termos de
resultados econômicos por custar mais do que o valor recebido.
Analisando-se a tabela 5, observa-se que, para a
produtividade de 3.200 kg de coá-
gulo por hectare, a remuneração pelo preço mínimo é insuficiente para cobrir os
custos de produção da seringueira. Porém, os preços médios recebidos pelos
produtores paulistas em fevereiro oferecem remuneração em níveis de COE e COT, apresentando
índice de lucratividade de 7,8% positivos.
Uma vez
que os custos operacionais aqui mensurados servem como remuneração da atividade
no curto prazo, os preços recebidos pelos produtores devem cobrir os custos
aqui considerados e apresentar margem suficiente para remunerar os demais
custos incorridos na produção que não foram contemplados no estudo.
Os dados
apresentados revelam pelo menos duas questões relevantes: a) o controle dos
custos na gestão eficiente dos fatores de produção (no caso, a mão de obra que
onera mais de 70% a atividade); e b) busca de alternativas para aumento da
produtividade, uma vez que os produtores não possuem poder de controle dos
preços recebidos pois estes são “dados“ pelo mercado.
____________________________________________________________
1Os autores agradecem a colaboração da APOTEX (Associação
Brasileira dos Produtores de Látex) e do Eng. Agrônomo Carlos Alberto De Luca,
Diretor Técnico do Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) de Votuporanga,
pela coleta dos preços dos fatores de produção.
2MARTIN,
N. B.; ARRUDA, S. T. Rentabilidade da cultura da seringueira. Informações Econômicas, São Paulo, v.
22, n. 7, p. 37-65, jul. 1992. Disponível em: <https://iea.agricultura.sp.gov.br/ftpiea/ie/1992/tec3-0792.pdf>. Acesso em: abr. 2017.
3INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA - IEA. Banco de dados.
São Paulo: IEA. Disponível em: <http://www.
iea.sp.gov.br/out/bancodedados.html>. Acesso em: abr. 2017.
4O
detalhamento da metodologia, bem como a coleta dos dados com os produtores,
é encontrado em: OLIVEIRA, M. D. M.; VEIGA FILHO, A. A.; FREDO, C. E. Custos de manutenção e rentabilidade da
seringueira em plena produção, região Noroeste do estado de São Paulo, 2014.
Análise e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 10, n. 2, p. 1-5, fev. 2015. Disponível em:
<https://iea.agricultura.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=
13598>. Acesso em: abr. 2017.
5Silva, J. R. et al. Valor
da Produção Agropecuária do Estado de São Paulo: resultado final 2016. Análises e Indicadores do
Agronegócio, São Paulo, v. 12, n. 4, abr. 2017. Disponível em:
<http://www.iea.sp.
gov.br/ftpiea/AIA/AIA-22-2017.pdf>.
Acesso em: abr. 2017.
6MARTIN, N. B. et al.
Sistema integrado de custos agropecuários - CUSTAGRI. Informações Econômicas, São Paulo, v.
28, n. 1, p. 7-28, jan. 1998. Disponível em: <https://iea.agricultura.sp.gov.br/ftpiea/ie/1998/tec1-0198.
pdf>. Acesso em: abr. 2017.
7MATSUNAGA, M. et. al. Metodologia de custo da produção
utilizada pelo IEA. Agricultura
pdf>. Acesso em: abr. 2017.
8Op. cit. nota 4.
Palavras-chave: seringueira, custo de produção, rentabilidade.
Data de Publicação: 15/05/2017
Autor(es):
Marli Dias Mascarenhas Oliveira (marlimascarenhasoliveira@gmail.com) Consulte outros textos deste autor
Elaine Cristine Piffer Gonçalves (elaine.piffer@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor