A Bovinocultura em Sistema Misto de Produção na Região de Atuação da APTA Regional de Presidente Prudente


A Unidade Regional de Pesquisa e Desenvolvimento (URPD) de Presidente Prudente, da APTA Regional, tem área de atuação em 32 municípios (Figura 1), possui fazenda experimental de 100 hectares e laboratórios de pesquisas em economia agrícola e sanidade animal, situados em Presidente Prudente, estado de São Paulo.

 

 

A região da URPD de Presidente Prudente possuía 1,5 milhão de cabeças de bovinos (15,1% do estado), divididas em 981 mil animais para corte, 161 mil para leite e 389 mil para mistos, sendo abatidos 401 mil animais, com produção de 6,5 milhões de arrobas (equivalente carcaça) de carne bovina e 84,5 milhões de litros de leite produzidos1. A carne bovina ocupa a segunda posição no valor da produção agropecuária (VPA), enquanto o leite está na sexta colocação2.

Tanto do ponto de vista biológico quanto do econômico, a pecuária bovina é uma atividade de produção que gera, simultaneamente, leite e carne. Essa característica deve ser considerada nas decisões do produtor e na formulação de políticas públicas3. O que varia é a importância relativa dada a cada um dos produtos, o que proporciona os vários sistemas de produção, que depende do nível de especificação desejado4. Esse atributo da pecuária bovina dificulta a conceituação exata dos sistemas mistos de produção de carne e leite, mas é importante no processo de tomada de decisões em todos os níveis de planejamento, seja estratégico, tático ou operacional5.

Os bovinos de produção conjunta de carne e leite são denominados com diferentes termos, como gado/bovinos mistos, dupla aptidão ou duplo propósito. Esta última é a definição para produção simultânea de leite por meio de ordenha das vacas, e de carne proveniente de machos e vacas de descarte enviadas para o abate, sem conotação específica com respeito ao nível de especificação do sistema, a forma de manejo e a genética dos animais.

A literatura nacional e internacional é restrita nesse tema, notadamente em economia agrícola, mas pode-se destacar trabalhos realizados no México e na Colômbia, que discutem tecnologias e produtividade, e em países europeus, que estão em outro patamar, pois abordam a sustentabilidade ambiental, produtiva e social.

O sistema misto de produção ainda é bastante observado nas propriedades rurais brasileiras, especialmente nas de menor porte ou onde a pecuária bovina não é sua principal atividade. Grande parte dos estudos e pesquisas, sejam privados ou públicos, é voltada para os sistemas de produção em grande escala, deixando em segundo plano os sistemas de produção de pequena escala.

Alguns pecuaristas, em sua maioria familiares, adotam a exploração mista, pois o leite permite liquidez mensal que cobre as despesas da propriedade, incluindo a manutenção dos trabalhadores. O excedente de animais é vendido para recria, engorda ou abate. Embora seja uma venda sazonal, esta tem participação importante na receita, permitindo que o produtor tenha duas fontes de renda, que se complementam, o que não implica necessariamente na eficiência e rentabilidade no sistema como um todo. Assim, críticas são imputadas ao sistema de produção misto com o argumento de que não se produzirá eficientemente nenhum dos dois produtos, acarretando baixa produtividade do rebanho e baixa renda da atividade. Nesse ponto, o maior dilema tecnológico está na genética dos animais, pois, quando se seleciona um produto, tende-se a prejudicar a eficiência do outro, além do manejo e do planejamento6.

Esse tipo de exploração (mista) é responsável por parte significativa da produção de leite no estado de São Paulo, bem como no país, e é importante fonte de renda para uma parcela expressiva dos produtores rurais, notadamente aqueles de pequeno porte e os também denominados como agricultura familiar. No Brasil, 64,2% do leite produzido provém da agricultura familiar, enquanto em São Paulo e no Oeste Paulista esse número corresponde a 75,2% e 50,6%, respectivamente7.

O objetivo deste trabalho é caracterizar a bovinocultura com ênfase no sistema misto de produção na área de atuação da URPD de Presidente Prudente da APTA Regional, com base LUPA 2016/178.

No estado de São Paulo, a região de Presidente Prudente possui 6,9% das Unidades da Produção Agrícolas (UPAs) e 8,3% da área total (ocupação do solo pelas UPAs). Todavia, soma 15,3% dos bovinos do estado e 79,6% das UPAs da região possuem bovinos contra 48,6% do estadual. Os bovinos no sistema misto estão em 44,3% das UPAs da região, contra 22,1% no estado. Conforme os números da tabela 1 e as informações citadas, percebe-se a importância da pecuária bovina na região em relação ao estado, em especial no sistema misto de produção.

 

 

Na figura 2, demonstram-se as concentrações por municípios de bovinos no sistema misto de produção para o estado. Como destaque da região de Presidente Prudente, observa-se que esses animais estão em maior proporção na região oeste do estado e divisa com Mato Grosso do Sul, o mesmo ocorre para a região.


 

Pelos dados da tabela 2, supõe-se que manejos, tecnologias, benfeitorias e equipamentos utilizados na região são menos frequentes. Entretanto, isso não se dá para todos os itens elencados e, assim, não se pode afirmar que a região é menos tecnológica que a média estadual, pois se leva em consideração a grande variabilidade das UPAs em vários aspectos, incluído o uso desses itens. Dessa forma, é de suma importância uma análise mais aprofundada das características especificadas dos diferentes extratos ou recortes (geográficos, econômicos e/ou sociais).

Destaca-se o uso da vermifugação e da mineralização que chega quase à totalidade na região, um pouco acima da média estadual, o que demostra que itens básicos e primordiais estão sendo empregados; já a utilização da inseminação artificial, misturador de ração e mesmo balança ainda estão muito aquém do desejado. Já na produção leiteira, há mais equipamentos proporcionalmente que no estado, e mais ordenhadeiras mecânicas que resfriador, havendo dois fatores que podem explicar a situação: o compartilhamento de resfriador e o uso de ordenhadeiras mais antigas e/ou simples (balde a pé).

 

 

Na tabela 3, observa-se que 39,7% das UPAs totais da região adotam o sistema misto, somando 348 mil animais com média de 37,3 animais/UPA. Há ainda as UPAs que têm mais de um sistema de produção de bovinos (múltiplo9), e nelas 44 mil animais estão no sistema misto. Assim, os bovinos mistos totalizam 392 mil, estando em metade (49,9%) das UPAs que possuem bovinos, apesar de serem 25,7% dos bovinos da região, o que corrobora a importância do sistema, não em número de animais ou produção, mas sim em número de propriedades, produtores e importância social.

 

Na tabela 4, são demonstrados os indicadores econômicos, no qual se observa uma baixa adesão às associações/cooperativas e sindicatos, especialmente no sistema misto. A assistência técnica governamental (pública) é elevada, mas baixa na assistência privada. O crédito rural apresenta valor baixo a médio e seguro rural bem baixo. Destaca-se o maior uso de internet que de computadores (apesar da utilização de ambos ser baixa), estando a diferença no emprego de smartphones e tablets particulares, também porque não há ainda energia elétrica em todas as UPAs. O microtrator tem uso inexpressivo e o de tratores de pneus também é baixo. Em geral, as UPAs do sistema misto apresentaram os piores resultados, ou seja, indicam um menor nível tecnológico.

 

 

Na tabela 5, nos itens para bovinos, o sistema misto de produção está abaixo do geral e dos demais sistemas em quase todos os itens (exceto para curral no sistema de corte). Nos itens para o sistema de corte, o misto também está abaixo do geral e mesmo do sistema leiteiro. E nos itens para o sistema leiteiro, o misto continua a apresentar valores inferiores ao geral e somente maior que o sistema de corte, o que não poderia ser diferente. Assim, infere-se que o sistema de produção misto é menos tecnológico que os demais sistemas, o que vai comprometer a produtividade e lucratividade deste sistema.

Destacam-se as UPAs com sistemas múltiplos, logo cada grupo de animais tem seus objetivos de produção definidos, mesmo que dividam instalações/equipamento ou manejos/tecnologias.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como pode se observar pelas informações apresentadas nas tabelas, o sistema misto de produção é adotado por parte relevante das UPAs do estado de São Paulo, sendo mais significativo ainda na região de Presidente Prudente. Os dados agregados não permitem muitas conclusões sobre a região e os sistemas de produção, visto que há uma grande variabilidade nas UPAs, pois há propriedades de excelentes níveis tecnológicos que elevam as médias, minimizando os efeitos dos valores baixos de muitas propriedades destas médias. Assim, é interessante a estratificação ou agrupamento das propriedades por característica estratégicas ou, ainda, um levantamento (por amostragem) junto aos produtores para obtenção de informações mais precisas, que pode ser útil para soluções mais assertivas para os problemas ou gargalos.

As propriedades que usam o sistema misto de produção de bovinos tendem a ser menos tecnológicas que as demais, incluindo aquelas que utilizam mais de um sistema, salientando que o maior dilema tecnológico está na genética dos animais10.

A especialização em sistema de produção tende ao uso de mais tecnologias e conhecimentos que, sistematicamente, podem proporcionar maior produtividade e lucratividade da produção.

 

 

1Instituto de Economia Agrícola – IEA. Banco de Dados. São Paulo: IEA, 2022. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/out/bancodedados.html. Acesso em: jun. 2022.

 

2SILVA, J. R. DA et al. Valor da Produção Agropecuária Paulista: estimativa final 2021. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 17, n. 8, p. 1-8, ago. 2022. Disponível em: http://www.iea.agricultura.sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-40-2022.pdf. Acesso em: jun. 2022.Acesso em: jun. 2022.

 

3GOMES, S. T. A dança dos preços do leite e da carne. Viçosa, 24 set. 1993. Disponível em: http://arquivo.ufv.br/der/docentes/stg/stg_artigos/Art_069 - A dança dos preços do leite e da carne (24-9-93).pdf

 

4BARBOSA, P. F. 2001. Sistemas mistos de produção de leite e carne bovina. In: CBNA, editor. Simpósio sobre Manejo, Nutrição e Sanidade de Gado Leiteiro. São Carlos. 2000.  p. 211–232. Disponível em: https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/doc/45201/1/sistemas-mistos-producao-13063-2.pdf.Acesso em: jun. 2022.

 

5Op. cit. nota 4.

 

6SANTOS, N. A. DOS AND M. G. SAUERESSIG. Sistema de Produção Para Pecuária Bovina de Duplo Propósito: a alternativa do CPAC. Brasília, 1993.Disponível em:  https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/
item/101490/1/doc-52.pdf. Acesso em: jun. 2022.

 

7IBGE. 2017. Censo Agropecuário de 2017. Rio de Janeiro. Disponível em: https://censos.ibge.gov.br/
agro/2017/resultados-censo-agro-2017.html
.

 

8SAASP - IEA/CATI. Projeto LUPA 2016/2017: Censo Agropecuário do Estado de São Paulo. Informações Econômicas. 2020, v.50; eie 09/2019. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/ie/2020/IE-19-2019.pdf. Acesso em: jun. 2022. Também disponível em:  http://www.iea.agricultura.sp.gov.br
/out/bilupa.php. Acesso em: jun. 2022.

 

9Múltiplo, UPAs que adotam mais de um sistema de produção de bovinos, ou seja, tem conjuntamente sistemas específicos de produção (corte, leite) e/ou misto.

 

10Op. cit. nota 6.

 

 

 

 

 

 

Palavras-chave: informações estatísticas, censo agropecuário, sistemas de produção bovina, pecuária bovina, desenvolvimento regional.

 

 

 

 

 

 


 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

PINATTI, E.; BÁNKUTI, F. I. A Bovinocultura em Sistema Misto de Produção na Região de Atuação da APTA Regional de Presidente Prudente. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 17, n. 9, p. 1-9, set. 2022. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.


Data de Publicação: 30/09/2022

Autor(es): Eder Pinatti (pinatti@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Ferenc Istvan Bánkuti (fibankuti@uem.br) Consulte outros textos deste autor