Fertilizantes refletem situação desfavorável no mercado de grãos

            O mercado de fertilizantes ainda repercute a atual crise da agricultura brasileira, especialmente na produção de grãos, com a descapitalização e o endividamento dos produtores rurais (principalmente os de soja). Isto se deve aos baixos preços recebidos pelos agricultores, ao câmbio sobrevalorizado, à alta nas cotações internacionais do petróleo e aos problemas climáticos em algumas regiões do País.
            A previsão do setor para 2006 é de decréscimo de 4,5% no consumo brasileiro de fertilizantes, em relação ao ano anterior quando se constatou uma retração na demanda desse insumo. As vendas de fertilizantes no Brasil em 2005 apresentaram queda de 11,3% comparado com o ano anterior, perfazendo o total de 20,194 milhões de toneladas de produto. Essa quantidade está bem aquém daquele observada em 2003 (22,796 milhões de toneladas).
            Tal desempenho foi influenciado pela redução da área plantada na safra 2005/06 de soja, algodão, arroz e trigo, assim como pelo menor uso de tecnologia. Em contrapartida, constatou-se maior comercialização em culturas como cana-de-açúcar, laranja e café, resultante da melhoria nas cotações e, conseqüentemente, da relação de troca entre o produto agrícola e o fertilizante.
            A soja foi a cultura que mais consumiu fertilizantes no Brasil em 2005, com quantidade estimada em 7,5 milhões de toneladas de produto (37,1% do total). Em seguida, aparecem milho (15,8%), cana-de-açúcar (14,0%), café (7,0%) e algodão herbáceo (3,9%), perfazendo essas cinco culturas 77,8% da quantidade consumida nesse ano.
            Em relação a 2004, o consumo de fertilizantes decresceu para várias culturas, como soja (16,9%), milho (12,7%), algodão herbáceo (26,9%), arroz (22,2%), trigo (28,5%), feijão (12,9%) e fumo (3,8%). Em contrapartida, observou-se acréscimo em algumas culturas, como cana-de-açúcar (5,2%), café (2,9%), laranja (5,4%) e reflorestamento (17,7%).
            Os fertilizantes são itens importantes na composição do custo de produção das diversas lavouras. De acordo com estimativas realizadas pela Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA)1 em 2005, o custo de adubação2 para o milho em relação à receita da produção agrícola3 foi de 28,1% na região Centro-Sul, inferior ao de 2004 (31,7%). Decréscimo na participação do custo dos fertilizantes na receita com a comercialização dos produtos também foi observado para café, cana-de-açúcar, feijão, citrus e trigo (figura 1).

Figura 1 - Estimativa da participação do custo de adubação na receita da produção agrícola das principais culturas, Região Centro-Sul, 2001-2005

            Em 2005, a menor comercialização de fertilizantes ocorreu na maioria dos estados, com algumas exceções como Minas Gerais e Espírito Santo que apresentaram acréscimo de, respectivamente, 5,6% e 12,6%, favorecidos pelo bom desempenho das vendas para a lavoura do café (arábica e robusta). Mato Grosso respondeu pela maior quantidade das entregas de fertilizantes em 2005, com 3,456 milhões de toneladas de produto (retração de 16,2% em relação ao ano anterior). O Estado representa 17,1% das entregas totais, seguido de São Paulo (15,4%), Minas Gerais (14,3%), Paraná (13,1%), Rio Grande do Sul (10,9%), Goiás (8,2%) e Bahia (5,8%) (tabela 1).

Tabela 1– Entregas de fertilizantes ao consumidor final, por região e Estado, Brasil, 2004-2006
(em mil toneladas de produto)

Região e Estado
2004
2005
Jan.-jul.2005 
Jan.-jul.2006
Variação (%)
(a)
(b)
(c) 
(d)
(b/a)
(d/c)
Região Sul
Rio Grande do Sul
2.826.288
2.194.064
687.709
813.937
-22,4
18,4
Santa Catarina
639.693
612.376
262.608
233.253
-4,3
-11,2
Subtotal
3.465.981
2.806.440
950.317
1.047.190
-19,0
10,2
Região Centro
Distrito Federal
56.721
44.324
13.961
12.133
-21,9
-13,1
Espírito Santo
232.091
261.444
115.757
125.004
12,6
8,0
Goiás
2.117.464
1.657.252
488.014
448.389
-21,7
-8,1
Mato Grosso
4.125.449
3.456.353
1.464.547
950.484
-16,2
-35,1
Mato Grosso do Sul
1.135.902
834.500
348.174
280.497
-26,5
-19,4
Minas Gerais
2.726.630
2.878.321
871.960
872.178
5,6
0,0
Paraná
3.146.374
2.646.067
1.160.948
1.146.651
-15,9
-1,2
Rio de Janeiro
44.322
41.176
22.357
28.769
-7,1
28,7
São Paulo
3.090.876
3.102.492
1.330.338
1.463.832
0,4
10,0
Tocantins
173.014
183.103
28.267
34.222
5,8
21,1
Subtotal
16.848.843
15.105.032
5.844.323
5.362.159
-10,3
-8,3
Região Nordeste
Alagoas
225.873
226.544
133.219
152.005
0,3
14,1
Bahia
1.294.322
1.163.866
378.953
395.205
-10,1
4,3
Ceará
33.497
31.692
19.111
20.031
-5,4
4,8
Maranhão
302.189
256.381
87.732
72.918
-15,2
-16,9
Paraíba
47.473
42.429
28.231
34.041
-10,6
20,6
Pernambuco
187.383
194.970
120.742
143.269
4,0
18,7
Piauí
108.768
111.220
18.412
21.509
2,3
16,8
Rio G. do Norte
47.719
45.932
24.589
28.541
-3,7
16,1
Sergipe
13.118
26.283
11.659
16.550
100,4
42,0
Subtotal
2.260.342
2.099.317
822.648
884.069
-7,1
7,5
Região Norte
192.323
183.942
97.673
99.363
-4,4
1,7
Brasil
22.767.489
20.194.731
7.714.961
7.392.781
-11,3
-4,2
Fonte: Associação dos Misturadores de Adubos do Brasil (AMA-Brasil), ANDA, Sindicato da Indústria de Adubos e Corretivos Agrícolas no Estado de São Paulo (SIACESP), Sindicato da Indústria de Adubos do Rio Grande do Sul (SIARGS) e Sindicato da Indústria de Adubos e Corretivos do Nordeste (SIACAN)

            A comercialização de fertilizantes em 2005 seguiu o padrão sazonal convencional, com concentração ainda maior das vendas no segundo semestre. Isto se dá simultaneamente ao plantio das culturas de verão que, no ano passado, absorveram 70,7% do total entregue (contra apenas 29,3% no primeiro semestre), destacando-se que 43,6% foram consumidos no trimestre agosto-outubro (figura 2).

Figura 2 - Fertilizantes entregues ao consumidor final, Estado de São Paulo e Brasil, janeiro de 2004 a julho de 2006

            Na quantidade total de fertilizantes entregue no Brasil, em 2005, a participação das formulações (em tonelada de produto) foi de 76,7% e a dos fertilizantes simples, de 23,3%. Os formulados são comercializados em três formas: granulado, pó e mistura granulada.
            A mencionada retração da demanda contribuiu para o declínio de 8,5% na produção da indústria nacional de produtos intermediários para fertilizantes, comparado com o ano precedente que totalizou 8,9 milhões de toneladas de produto. Observou-se, assim, retração nas quantidades produzidas, em termos de nutrientes, dos fertilizantes fosfatados (10,4%) e potássicos (3,3%), enquanto houve acréscimo nas dos nitrogenados (1,5%).
            No caso das matérias-primas para fertilizantes, constatou-se menor produção de amônia, rocha fosfática-industrial, ácido fosfórico e ácido sulfúrico. No referido período, as importações brasileiras de produtos intermediários para fertilizantes decresceram 24%, totalizando 11,724 milhões de toneladas de produto. O cloreto de potássio foi o principal produto importado, respondendo por 43,1% do total, seguido de uréia (13,6%), sulfato de amônio (11,8%) e fosfato mono-amônio-MAP (10,3%).
            Também no período de janeiro a julho de 2006 a produção da indústria nacional de produtos intermediários para fertilizantes foi inferior (2,5%) ao registrado no mesmo período do ano anterior, somando 4,794 milhões de toneladas de produto. Já as importações brasileiras de fertilizantes, no referido período, decresceram 10,1%, perfazendo 5,4 milhões de toneladas de produto.
            Em 2006, nos sete primeiros meses, as entregas de fertilizantes ao consumidor final no País apresentaram queda de 4,2%, em relação a igual período do ano anterior, totalizando 7,393 milhões de toneladas de produto. O comportamento, porém, é bastante diferenciado quando os dados são analisados em termos de região e por estado.
            Somente na região Centro houve retração nas entregas (de 8,3%), de acordo com o critério de regionalização para o Brasil do SIACESP. As demais regiões apresentaram crescimento: Sul, de 10,2%; Nordeste, de 7,5%; e Norte, de 1,7%. Observa-se que o estado do Mato Grosso, maior produtor nacional de soja (com 26,5% da área plantada em 2005/06), apresentou, no referido período, a maior queda nas entregas (31,5%)4.
            Em agosto de 2006, especificamente, as entregas nacionais ficaram 4,3% abaixo das observadas no mesmo mês do ano anterior, totalizando 2,476 milhões de toneladas de produto. Há expectativa de aquecimento na demanda no período setembro-novembro, com tendência de concentração de entregas, o que certamente esbarrará em gargalos logísticos. Tal fato deverá provocar congestionamento, inclusive portuário, e atrasos na distribuição dos fertilizantes, com o encarecimento dos custos de frete.
            Ressalte-se, ainda, que as dívidas contraídas pelos agricultores nas safras anteriores restringem a capacidade de investimentos alavancados por novos financiamentos, o que leva tanto a diminuição de área plantada quanto a redução no uso de tecnologia.
            No Brasil, estima-se que a entrega de fertilizantes ao consumidor final alcance este ano em torno de 19,3 milhões de toneladas. Este volume retorna ao nível de 2002, portanto inferior às entregas de 20,194 milhões observadas em 2005, tendo em vista a expectativa de redução da área plantada de grãos na safra 2006/07, especialmente soja e milho na região Centro-Oeste. Por outro lado, espera-se maior comercialização para culturas como laranja, algodão, cana-de-açúcar e café, bem como o reflorestamento.
            O bom desempenho das vendas no mercado da laranja pode ser explicado pelo aumento dos preços recebidos pelos citricultores, com a conseqüente melhoria da relação de troca entre o produto agrícola e o fertilizante (tabela 2). Também os cotonicultores devem ampliar as suas aquisições em decorrência do aumento de área plantada de algodão na temporada 2006/07, em relação à safra anterior.

""

            No caso da cana-de-açúcar, a aquisição de fertilizantes está relacionada com o acréscimo das cotações do açúcar no mercado internacional, associado à elevação das exportações e à maior demanda interna de álcool com o fenômeno de venda dos carros com motor flex fuel.  A produção nacional de cana-de-açúcar no ciclo 2006/07 está estimada em 471,2 milhões de toneladas, superando em 9,2% a safra passada. Esse resultado mantém a safra atual como a maior da história.
            A maior safra de cana ocorreu em função do aumento de 5,5% na área (passando de 5,8 milhões de hectares em 2005/06 para 6,2 milhões/ha em 2006/07) e de 3,5% na produtividade. Esse incremento é resultado dos investimentos em tecnologia e em novas usinas/destilarias. São Paulo é o estado mais importante, com 282,1 milhões de toneladas (ou 59,9% do total) em uma área de 3,3 milhões de hectares. Já o Norte/Nordeste contribui com 13,7% de toda a produção5.
            Esta desempenho do setor contribuiu em parte para que em São Paulo, nos sete primeiros meses de 2006, o mercado de fertilizantes mostrasse um bom resultado comercial. Ou seja, houve acréscimo de 10% nas entregas, em relação ao mesmo período de 2005, perfazendo o total de 1,464 milhão de toneladas. O mesmo pode se dizer da região Norte/Nordeste.
            No caso do café, a estimativa para a safra 2006/07 é de colheita de 41,6 milhões de sacas de 60 quilos, um crescimento de 26,2% ou 8,6 milhões de sacas em relação à safra anterior. O incremento decorre principalmente dos tratos culturais adequados e do maior uso de tecnologia, estimulados pela recuperação dos preços no mercado, assim como da bienalidade positiva da cultura6. Além disso, há alguma interferência da estiagem observada principalmente na maioria das regiões produtoras de grãos, principalmente no Sul e Sudeste7.
            O Estado de Minas Gerais é o maior produtor de café (representa 50,9% do total nacional), seguido de Espírito Santo (21,7%) e São Paulo (10%).8
_____________________
1ANUÁRIO ESTATÍSTICO: SETOR DE FERTILIZANTES 2005. São Paulo, ANDA,2006
2Preço médio anual pago pelo agricultor multiplicado pela quantidade aplicada na lavoura.
3 Preço médio anual recebido pelo agricultor multiplicado pela produtividade média.
4 CONAB. Avaliação da safra agrícola 2005/06, Nono levantamento. Agosto 2006. Disponível em: http://www.conab.gov.br/. Acesso em: agosto de 2006
5 CONAB. Cana-de-açúcar safra 2006/2007, Segundo levantamento, Agosto 2006. Disponível em: http://www.conab.gov.br/download/safra/BoletimCanaagosto2006-07.pdf. Acesso em: agosto de 2006.
6 CONAB. Cafés do Brasil, Terceiro levantamento, Agosto 2006. Disponível em: http://www.conab.gov.br/. Acesso em: agosto de 2006.
7 IBGE - Levantamento Sistemático da Produção Agrícola. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/agropecuaria/lspa/textolspa072006.pdf. Acesso em: agosto de 2006.
8 Artigo registrado no CCTC-IEA sob número HP-96/2006.

Data de Publicação: 15/09/2006

Autor(es): Célia Regina Roncato Penteado Tavares Ferreira Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor