Milho: demanda por etanol eleva cotações

            A agroenergia está mudando o perfil do mercado internacional de commodities. Um exemplo é a demanda crescente por milho para a produção de etanol que vem provocando aumentos significativos dos preços do grão nas bolsas internacionais.
                O desvio de parte da produção de milho dos Estados Unidos para a produção do etanol e o crescente aumento das importações do grão por parte da China explicam o fato de os preços futuros do milho terem registrado, na Bolsa de Chicago (Chicago Board of Trade - CBOT), no final de fevereiro de 2007, o maior valor dos últimos dez anos. Em 2006, os preços do milho, no mercado internacional, subiram 89,6%¹ (Figura 1).


Figura 1 - Cotações do Milho na Bolsa de Chicago (CBOT), Janeiro de 2006 a Março de 2007.

Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos da CBOT.


            O milho foi cotado a US$2 o bushel de 56 libras-peso durante anos, antes que o boom do etanol fizesse os preços subirem rapidamente, alcançando US$4,04 por bushel. Estes devem ter novas altas nos próximos cinco anos, segundo Keith Collins, economista chefe do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês). Segundo o estudo "USDA Agricultural Projections to 2016", de fev. 2007, o preço do milho deverá oscilar entre US$3,30 e US$3,80 por bushel nos próximos dez anos.
            Estão em operação em solo norte-americano 111 biorrefinarias de etanol e mais 78 encontram-se em fase de construção, de acordo com a Associação Industrial de Combustíveis Renováveis. Para suprir a demanda americana, os agricultores terão de plantar 90 milhões de acres em milho até 2010 - quase 10 milhões a mais que a área atual, segundo o próprio USDA.
            O crescimento do setor implica que proporção cada vez maior da safra mundial de milho seja usada para alimentar as imensas usinas que produzem etanol. De acordo com algumas estimativas, as usinas de etanol estarão consumindo até metade do suprimento nacional de milho norte-americano, dentro de poucos anos. Em 2007, a demanda por etanol conduzirá os estoques de milho aos seus mais baixos níveis desde 19952.
            Essa tendência altista na Bolsa de Chicago já se reflete no mercado interno brasileiro. A saca de milho, no âmbito dos produtores paulistas, foi cotada a R$19,62, em março de 2007, época de colheita, uma queda de 6,5% em relação ao mês anterior, segundo o Instituto de Economia Agrícola (IEA). No mesmo mês de 2006, a queda foi de 15,8% (Figura 2).


Figura 2 - Preços Recebidos pelos Produtores de Milho no Estado de São Paulo, Janeiro de 2006 a Março de 2007.

 
Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos do IEA.


            A atratividade dos novos negócios no mercado internacional também vem acarretando a sustentação de preços internos, criando um cenário na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) semelhante àquele observado em Chicago (Figura 3).


Figura 3 - Cotações do Milho, Segunda Posição na BM&F, Janeiro de 2006 a Março de 2007.

Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos da BM&F.


            No mercado futuro de milho da BM&F, o volume negociado em dólar (futuros e opções) em 2006 foi recorde histórico, com US$502 milhões, 35% superior ao do ano anterior. Os negócios cresceram 38,2% em 2006 em relação aos de 2005, atingindo o total de 135.188 contratos3 (Figura 4). Nos últimos anos houve tendência de crescimento dos contratos do setor na BM&F.


Figura 4 - Evolução Anual dos Contratos de Milho Negociados na BM&F, 1999 a Jan.-Mar. de 2007.

Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos da BM&F.


            Os negócios em 2006, na BM&F, representaram 3,74 milhões de toneladas de milho, o equivalente a 8,7% do total produzido no mesmo período (Figura 5). Apesar dessa pequena participação há potencial de crescimento desse mercado, tanto para produtores e outros hedgers administrarem o risco de preço como para especuladores fazerem posição em relação à volatilidade do mercado.


Figura 5 - Evolução Anual dos Contratos de Milho Negociados na BM&F em Equivalente Produto, 1999 a 2007.

Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos da BM&F.


            Analistas desse mercado tentam visualizar onde vão parar os preços do milho: se se sustentarão nos atuais níveis - na faixa dos US$4 por bushel - ou se recuarão em caso de forte crescimento da safra norte-americana.
            Conforme o Prospective Plantings, realizado pelo USDA no fim de março de 2007, a intenção de plantio de milho nos EUA deve ser de 90,5 milhões de acres na safra 2007/08, 15% a mais do que no ciclo anterior.
            O consumo de milho para a produção de álcool deve alcançar 80,6 milhões de toneladas em 2007/08, 49% mais do que no ciclo anterior, segundo o USDA. Isso significa um forte aumento no uso doméstico no país - inclui ração, alimentos, etanol, sementes e outros -, de 240 milhões de toneladas em 2006/07 para 262,1 milhões de toneladas em 2007/08.
            Jack Scoville, da Price Futures Group, em Chicago, avalia que os preços do milho podem ficar "mais perto" de US$3,00 se a produção americana do grão alcançar o recorde de 327 milhões de toneladas. Mas não devem voltar aos patamares de US$2,00 por bushel vistos até 2005.5
            Contribui para isso o fato de que a produção chinesa de milho não será suficiente para garantir o crescente aumento da demanda no mercado interno. Segundo dados do USDA, a China produziu 143 milhões de toneladas de milho em 2006/07 e consumiu 141 milhões de toneladas6.
            O próprio governo chinês revela que em 2006 a capacidade de processamento de milho da indústria foi de 70 milhões de toneladas, um crescimento de 40%. Para 2007, a previsão é de que 75 milhões de toneladas de milho sejam processadas. Com o crescimento do milho na indústria de ração e alimentos e a disposição em também usar o milho para a produção de etanol, os chineses deverão, já em 2007, passar de exportadores para importadores de milho.

Entre os anos-safras de 2002/03 e 2006/07, o consumo mundial esteve bem próximo à produção mundial (Tabela 1).

Tabela 1 - Balanço Mundial de Milho, 2002/03 a 2006/071

(em milhão de toneladas) 

Ano-safra
Produção
Consumo
Estoque final
Exp.=imp.
2002/03
602,974
627,298
125,771
78,487
2003/04
625,844
647,757
103,858
79,235
2004/05
712,626
685,202
131,282
76,577
2005/06
695,196
702,265
124,213
83,062
2006/071
695,847
728,241
91,819
85,075

1Projeções.

Fonte: USDA.

A taxa de crescimento médio anual do consumo mundial de milho foi de 3,86%, enquanto a taxa de crescimento médio anual da produção mundial nesses cinco anos foi de 3,99%. Esse aumento do consumo próximo à produção ocasionou uma redução dos estoques finais mundiais nesses últimos anos, cuja taxa de crescimento média anual foi de -4,40%. Portanto, existe uma perspectiva favorável de sustentação das cotações do milho.
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1GUIMARÃES, J. dos S. (19 jan. 2007). Milho, a hora e a vez. Disponível em: <http://www.agenciameios. com.br/noticias/noticia/230>.
2RUNGE, F.; SENAUER, B. da "FOREIGN AFFAIRS". A bolha do etanol C. Disponível em: <http:// www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u106159.shtm>.
3Cada contrato de milho na BM&F equivale a 450 sacas de 60kg cotado em R$/saca de 60 kg.
4BOLSA DE MERCADORIAS E FUTUROS – BM&F. Disponínvel em: <http://www.bmf.com.br/2004/pages/mprensa1/ relatorios/RelMensal/RelatorioMensal_Abril2007.pdf>. Acesso em: 13 abr. 2007.
5HORA da verdade para os preços do milho. Valor Econômico, São Paulo, 29 mar. 2007. Disponível em: <http://www.suinoculturaindustrial.com.br/site/dinamica.asp?id=26133&tipo_tabela=negocios&categoria=insumos>.
6FAS. USDA. Disponível em: <http://www.fas.usda.gov/psdonline/psdreport.aspx>. Acesso em: 13 abr. 2007

Palavras-chave: preços, milho, etanol.

Data de Publicação: 10/05/2007

Autor(es): Luis Henrique Perez Consulte outros textos deste autor
Raquel Castelluci Caruso Sachs (raquelsachs@apta.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
José Venâncio De Resende Consulte outros textos deste autor