Geração de Bioenergia de Biomassa da Cana-de-açúcar nas Usinas Signatárias ao Protocolo Agroambiental Paulista, Safra 2015/2016

O setor elétrico brasileiro é abastecido preponderantemente pela hidroeletricidade que, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), responde por 61,21% de seu consumo (Tabela 1). No entanto, esta dependência é cada vez mais preocupante em razão da modificação que vem ocorrendo no regime de chuvas, haja vista, o ano de 2014. Ao mesmo tempo, há também a irregularidade das chuvas, concentradas no verão e no início do outono, entre os meses de dezembro e abril, o que leva à necessidade de se buscar outras fontes de energia, lembrando ainda que a construção de barragens com grandes reservatórios passa por restrições impostas pela legislação ambiental.

As fontes de energia existentes de origem biomassa, como: agroindustriais, biocombustíveis líquidos, floresta, resíduos animais e resíduos sólidos urbanos, representam 8,9% do total da matriz energética brasileira, dos quais 76,8% são provenientes do bagaço da cana-de-açúcar (Tabela 1)1.

O bagaço, resíduo da produção de açúcar e etanol, é uma das importantes fontes de energia renovável das unidades industriais de cana-de-açúcar, sendo utilizado na produção de energia elétrica denominada bioeletricidade, em que parte é utilizada para o atendimento da própria unidade industrial e o excedente exportado para a rede de distribuição. Na safra 2015/16, a produção desse resíduo foi de 166,40 milhões de toneladas no País. O Estado de São Paulo respondeu por 55,2% dessa produção (Tabela 2)2

A bioeletricidade está em consonância com a agenda mundial, o Brasil estabeleceu como meta na COP-21, a intenção de alcançar o índice de 18% de biocombustíveis sustentáveis (etanol e biodiesel) e aumentar de 10% para 23% a participação de energias renováveis (solar, eólica e biomassa) na matriz energética em 20303. Os dados apresentados no último Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE 2024) apontam que o potencial técnico de geração anual para a rede pela biomassa da cana-de-açúcar pode alcançar quase duas usinas do porte de Itaipu, gerando 165 TWh/ano até 20244.

 


A biomassa oriunda do bagaço da cana-de açúcar é uma alternativa de energia renovável com potencial para complementar a geração de energia proveniente da hidrelétrica do País. A produção dessa energia ocorre justamente no período da estação seca, em que os reservatórios se encontram no nível mais baixo. Ressalte-se que a região Sudeste concentra o maior número das unidades industriais gerando energia elétrica através da biomassa próxima aos grandes centros consumidores de energia5.

O setor sucroenergético do país é autossuficiente na produção de energia elétrica por meio da biomassa e comercializa excedentes para o Sistema Interligado Nacional (SIN)6. O setor vem expandindo a produção de bioeletricidade como fonte renovável e complementar à geração hídrica, haja vista que na safra em questão o setor exportou 57,11% de energia elétrica do total produzido pelas usinas signatárias.

No Estado de São Paulo, com o objetivo de criar mecanismos para estimular e consolidar o desenvolvimento sustentável da produção e da indústria da cana-de-açúcar, foi firmado um acordo voluntário, representado pelas Secretarias do Meio Ambiente (SMA) e de Agricultura e Abastecimento (SAA) e o Setor Sucroenérgetico, representado pela União da Indústria da Cana-de-açúcar (UNICA) e pela Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (ORPLANA). O compromisso com as unidades agroindustriais foi firmado em 2007, através da UNICA, enquanto o compromisso com as associações de fornecedores de cana pela ORPLANA em 2008.

O número de usinas signatárias a esse protocolo representa 84,4% do total de unidades cadastradas no departamento de cana-de-açúcar e agroenergia do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), em fevereiro de 20177.

Por meio do cumprimento do Protocolo Agroambiental do Estado de São Paulo, as usinas signatárias nos últimos 8 anos, em termos de potência instalada, evoluíram de 1.865,04 MW8 para 5.125,51 MW, ou seja, 2,75 vezes (Figura 1). Já em relação ao número de unidades industriais signatárias na safra 2007/08, 23,9% exportaram energia para o SIN enquanto na safra 2015/16 mais da metade das unidades (58%) contribuíram para o fornecimento de energia na rede de distribuição.

Com relação à quantidade de energia produzida pelas signatárias, verificou-se que ocorreu um aumento de 3,02 vezes a produção de energia em MWh entre as safras 2007/08 e 2015/16. Essas unidades industriais nesse mesmo período exportaram para o SIN 4,27 vezes mais MWh (Figura 2).

As Regiões Administrativas (RA) do Estado de São Paulo que mais produziram energia através da biomassa da cana-de-açúcar estão situadas nos municípios pertencentes à região de São José do Rio Preto onde estão localizadas 23 usinas, seguida das regiões de Ribei-

 

rão Preto (14), Campinas (20), Bauru (12) e Araçatuba (15), as quais representaram 64,37% do total de energia produzida pelas signatárias no estado na safra 2015/16 (Figura 3).

 

 

 

Com relação à exportação de energia para rede de distribuição, novamente se destacou a RA de São José de Rio Preto, seguida de Campinas, Ribeirão Preto, Bauru e Araçatuba, as quais representaram 64,5% do total exportado de todas as RAs (Figura 4).

 

 

O total exportado de 10,04 milhões de MWh pelas signatárias representou cerca de 26,4 % do consumo anual residencial paulista, que em 2015 foi de 38,03 milhões de MWh, segundo os dados de energia da Secretaria de Energia e Mineração em 20159.

Segundo Souza10,

manter o ritmo de crescimento elevado de geração pela biomassa passa pela continuidade de contratação de novos projetos nos mercados regulado e livre de energia elétrica. As perspectivas são promissoras para o mercado livre, mas, pelo menos nos próximos anos, ainda será o mercado regulado a porta de entrada para boa parte dos projetos de bioeletricidade, com os leilões regulados ainda organizando o sinal da expansão no setor elétrico brasileiro.

Como pode ser observado pela evolução das signatárias na produção e exportação de energia elétrica, o setor sucroenergético tem demonstrado que tem capacidade para contribuir de forma significativa para fornecimento de energia renovável para manter a segurança e sustentabilidade da matriz energética brasileira. Para tanto, são necessárias formulação de políticas públicas de longo prazo que contemplem a modernização das usinas (retrofit), para o aproveitamento total do bagaço e da palha, e instrumentos financeiros que possibilitem investimentos na rede de distribuição. Outro ponto que pode ser revisto pelas autoridades brasileiras são os leilões cuja fonte é a biomassa que tem sido relegada a segundo plano, com preços não competitivos, em relação às energias solar, eólica e de pequenas centrais hidrelétricas.

 

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1AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA - ANEEL. Banco de Informações de Geração. Brasília: ANEEL, 2017. Disponível em: <http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/capacidadebrasil/OperacaoCapacidadeBrasil.cfm>. Acesso em: 4 abr. 2017.

 

2TORQUATO, S. A.; RAMOS, R. C. Biomassa da cana-de-açúcar e a geração de bioeletricidade em São Paulo: usinas signatárias ao Protocolo Agroambiental Paulista. Informações Econômicas, São Paulo, v. 43, n. 4, p. 59-68, set./out. 2013. Disponível em: <http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/publicacoes/ie/2013/tec6-1013.
pdf>. Acesso em: abr. 2017.

 

3União da Indústria de Cana-de-Açúcar - Unica. UNICA celebra acordo para o clima na COP21. São Paulo: Unica, dez. 2015. Disponível em: <http://www.unica.com.br/noticia/22757742920320153336/unica-celebra-acordo-para-o-clima-na-cop21/>. Acesso em: fev. 2017.

 

4ANUÁRIO BRASILEIRO DA CANA-DE-AÇÚCAR 2016. Podia ser muito mais. Santa Cruz do Sul: Ed. Gazeta, 2016. Disponível em <http://www.editoragazeta.com.br/flip/anuario-cana-2016/files/assets/basic-html/page1.
html>. Acesso em: mar. 2017.

 

5TATONI, W. M.; ROCHMAN, R. R. Viabilidade da cogeração. Agroanalysis, Rio de Janeiro, p. 21, set. 2012. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/agroanalysis/article/viewFile/24520/23288>.
Acesso em: 21 fev. 2017.

 

6ANUÁRIO BRASILEIRO DA CANA-DE-AÇÚCAR 2016. Que Massa! Santa Cruz do Sul: Ed. Gazeta, 2016. Disponível em: <http://www.editoragazeta.com.br/flip/anuario-cana-2016/files/assets/basic-html/page1.html>.  Acesso em: jan. 2017.

7MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA. Relação de instituições cadastradas no departamento de cana-de-açúcar e agroenergia. Brasília: MAPA, 2017. Disponível em: <http://sistemas
web.agricultura.gov.br/sapcana/downloadBaseCompletaInstituicao.action?sgJAASAplicacaoPrincipal=sapcana>. Acesso em: 18 fev. 2017.

 

8MATOS, C. R. A. et al. Protocolo agroambiental do setor sucroenergético paulista: dados consolidados das safras 2007/08 a 2013/14. São Paulo: UNICA/ORPLANA/SAA/SMA. Disponível em: <http://www.iea.sp.
gov.br/Relat%C3%B3rioConsolidado1512.pdf
>. Acesso em: nov. 2016.

 

9SECRETARIA DE ENERGIA E MINERAÇÃO. Dados Energéticos. São Paulo: Secretaria de Energia e Mineração, 2017. Disponível em: <http://dadosenergeticos.energia.sp.gov.br/portalcev2/index.html>. Acesso em: 21 fev. 2017.

 

10SOUZA, Z. J. Geração pela biomassa cresce quase 6% em 2016. São Paulo: unica, fev. 2017. Disponível em: <http://www.unica.com.br/colunas/9851879920328608058/geracao-pela-biomassa-cresce-quase-6-por-cento/>. Acesso em: mar. 2017.


Palavras-chave: bioeletricidade, Protocolo Agroambiental, cana-de-açúcar.


Data de Publicação: 12/04/2017

Autor(es): Rejane Cecília Ramos Consulte outros textos deste autor
Katia Nachiluk (katia.nachiluk@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor