Evolução Tecnológica, Rede de Apoio e Perfil do Cafeicultor do EDR de Franca, Estado de São Paulo


 

1 - INTRODUÇÃO

Dentre os diversos cinturões cafeeiros paulistas, o centrado nos municípios que compõem o EDR de Franca é o mais importante. A região antes chamada de “Alta Mogiana” sempre possuiu realce na produção paulista de café, não apenas pela quantidade ofertada a cada nova safra, mas principalmente pela reputada qualidade da bebida pelo café ali produzido. As condições edafoclimáticas vigentes (altitude, solos profundos e clima com estações bem definidas) são muito apropriadas para o cultivo do cafeeiro, o que, por sua vez, é determinante para os atributos alcançados pela produção regional.

O EDR de Franca é formado por 13 municípios: Altinópolis, Batatais, Cristais Paulista, Franca, Itirapuã, Jeriquara, Patrocínio Paulista, Pedregulho, Restinga, Ribeirão Corrente, Rifâina, Santo Antônio da Alegria e São José da Bela Vista. Em termos territoriais, o EDR soma aproximadamente 516 mil hectares, dos quais 15% ocupados com culturas perenes2.

Apesar de relativa concentração na cafeicultura, o EDR de Franca é bastante diversificado, existindo nele atividades agrícolas, pecuárias e florestais. Em seu conjunto, em 2019 – ano de ciclo de baixa das lavouras -, o EDR amealhou R$2,22 bilhões em valor bruto da produção agropecuária. Esse montante se eleva em 15% a 20% quando é contabilizado, concomitantemente, nos anos de ciclo de alta da lavoura3, 4. Na safra agrícola 2019/20 (comercial 2010/21), a área cultivada somou 68,4 mil ha, com estimativa de produção de 2,56 milhões de sacas de café arábica beneficiado (45% do total paulista), representando produtividade de 37,5 sc./ha, média excepcional para sistema de cultivo de sequeiro.

O EDR de Franca se consolidou enquanto arranjo produtivo local em café. Além de nele se situar a maior e melhor cooperativa de cafeicultores do Estado – COCAPEC (produção e crédito) -, possui selo de Identidade Geográfica do Café reconhecido pelo INPI (Alta Mogiana Specialty Coffee Association - AMSC) e conta com outras associações de cafeicultores municipais com prestação exemplar de serviços aos membros (Associação dos Cafeicultores de Jeriquara, com atuação em comércio justo com importadores europeus), ampla gama de firmas de máquinas agrícolas e de equipamentos, empresas de consultoria técnica e financeira (crédito e seguro rural) e serviço de assistência técnica oficial com técnicos altamente especializados no manejo da lavoura cafeeira.

Diante da importância da região na produção cafeeira paulista, este estudo objetiva analisar os dados censitários da base produtiva cafeeira, tecnologia utilizada e a evolução do perfil dos cafeicultores do EDR de Franca e das principais regiões relevantes para a lavoura a partir dos resultados obtidos pelo Projeto LUPA 2016/175, comparativamente ao levantamento anterior LUPA 2007/086.

 

2 – MATERIAL E MÉTODO

A fonte utilizada dos dados correlacionados neste estudo foi obtida a partir dos Levantamentos Censitários de Unidades de Produção Agropecuária (Projeto LUPA), realizado pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA) por meio da Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS) e do Instituto de Economia Agrícola (IEA), campanhas de 2016/17 e de 2007/08. A unidade básica de levantamento (UPA) coincide na maioria das vezes com o imóvel rural, entendido como conjunto de propriedades contíguas do mesmo proprietário. Esse levantamento inclui todas as áreas plantadas com café, inclusive aquelas que não são de interesse para estudos socioeconômicos.

A abordagem será conduzida explicitando os resultados agregados obtidos para a cafeicultura no EDR de Franca. Para atingir os objetivos elencados, foram utilizados métodos quantitativos, cálculo de frequências simples e de taxas com intuito de descrever a dinâmica da produção cafeeira regional no período considerado.

 

3 – RESULTADOS

No EDR de Franca, ao contrário do que se observou para o Estado de São Paulo, a participação relativa da cafeicultura avançou 34,15% em termos de área no intervalo intercensitário, representando incremento de mais de 17,13 mil ha em novas áreas de lavouras de café. Contabilizando todas as demais perenes (inclusive o café), totalizou 18,81 mil ha. Esse resultado, assim como as variações observadas em termos de número de UPAs (12,32%) e de pés (53,12%), demonstra que o EDR é de fato um arranjo produtivo local consolidado, construindo rota de crescente especialização produtiva na cafeicultura (Tabela 1).

 

 

O uso do solo para a implantação de atividades agropecuárias e florestais é outro indicador relevante para elucidar os vetores prevalecentes do desenvolvimento rural regional. Assim, no espaço intercensitário houve incremento de aproximadamente 10% de ocupação do solo com lavoura de café (de 28,60% para 37,73%). Em que pese às leis ambientais e as exigências das empresas certificadoras, há disponibilidade de mais de 100 mil ha de áreas nas UPAs para que a cafeicultura continue sua marcha de expansão na região (Tabela 2).

 

 

Excetuando-se a tecnologia de Manejo Integrado de Pragas (MIP), todas as demais técnicas agronômicas exibiram expressivo incremento, em termos de sua adoção, entre os cafeicultores do EDR de Franca (Tabela 3). A ampla disseminação pela área cultivada das diferentes estratégias combinadas de recuperação e manutenção da fertilidade do solo (mineral, orgânica e verde) denotam o grau de reconhecimento sobre a importância dessas tecnologias para o alcance de excelência em produção e produtividade cafeeira.

 

A correção da acidez tóxica por emprego do calcário pode ser uma tática relevante para que a região confirme sua liderança estadual em café. Cerca de 10 mil ha ainda não adotam essa rotina de manejo pouco custosa e de excepcionais resultados em seu calendário de condução da lavoura.

As lavouras conduzidas em sequeiro sob manejo convencional são predominantes frente a sistemas produtivos alternativos como o orgânico (Tabela 4). As condições prevalecentes de clima (mais ameno em termos de temperatura média), associado a escassez de recursos hídricos abundantes, reduzem o interesse por implantação de sistemas de produção irrigados. Combinando tecnologias agronômicas disponíveis (gessagem, adensamento, manejo do mato, podas, nutrição equilibrada e de preferência organomineral) é possível obter elevada produção em produção de sequeiro e, aparentemente, essa é a rota que se estabelece na região.

O perfil empresarial dos cafeicultores do EDR de Franca fez da adesão às práticas de colheita mecanizadas e mistas ser bastante disseminada, em detrimento da colheita exclusivamente manual. A ampliação da colheita mecânica em 135,88% no período intercensitário atende 90% da área com lavoura (Tabela 5). A segmentação e especialização do trabalho na região têm na prestação de serviços de colheita uma das que mais se destacam, permitindo que até mesmo os cafeicultores familiares se valham do trabalho das colhedoras automotrizes de café.

 

 

Tanto o avanço do uso de computadores na gestão das explorações agropecuárias como o acesso à internet constituem capacitações digitais chave para o imediato ingresso da cafeicultura regional na chamada agricultura 4.0 (Tabela 6). No LUPA 2016/17, mais da metade da área cultivada com lavouras de café já empregava essas tecnologias nas explorações.

 

A contratação do seguro rural também ganhou muitos novos adeptos entre os cafeicultores da região, exibindo expansão de 274,17% no espaço intercensitário. Ressalta-     -se que cerca de 56% das UPAs prescindem do crédito rural para o financiamento das atividades produtivas, ou seja, recorrem ao autofinanciamento ou as novas formas de alavancagem, como são as operações barter.

A contratação de técnicos para prestação de serviços de assistência técnica se tornou majoritária frente à atuação do sistema público de extensão rural. Em termos de área cultivada, tal prevalência já era observável no censo anterior (Tabela 7). O perfil empresarial, associado à dimensão dos imóveis que atuam na cafeicultura, permite essa relativa independência desses cafeicultores perante a assistência técnica pública. O cooperativismo vem ganhando mais adeptos (53,91%), o qual entrega em um dos serviços prestados a assessoria técnica agronômica. O número de cafeicultores que participam de associações permaneceu estável, mas se ampliou a área de lavoura em que associações estão presentes. Por sua vez, a sindicalização continua em expansão entre os cafeicultores.

 

 

 

4 – CONCLUSÕES

A ocupação do solo com a lavoura de café, no EDR de Franca, se inicia conjuntamente com o processo de colonização de suas terras desencadeado pela paulatina expansão da malha ferroviária paulista. A produção café ao longo das primeiras décadas do século passado foi angariando inigualável reputação no mercado nacional e internacional, aspecto que persiste até a atualidade.

O LUPA 2016/17 trouxe relevantes informações estatísticas do segmento na região. Os indicadores submetidos à enquete demonstram que, independente do aspecto que se observe, houve significativa expansão. Tecnologias de manejo agronômico, de mecanização da colheita e de irrigação exibiram crescimento, assim como a procura por crédito rural, seguro e a participação em cooperativa, sindicato e associação.

A especialização regional na atividade cafeeira conforma um arranjo produtivo local sustentado e liderado por sólidas organizações sociais locais. Toda a evolução constatada pelos números exibidos converge para um fortalecimento ainda maior desse arranjo, com ganhos de eficiência técnico-produtiva, produzindo uma espécie de círculo virtuoso direcionado para uma maior e mais estruturada produção de riqueza que, em última instância, sustenta o desenvolvimento rural.

A trajetória técnico-produtiva da cafeicultura do EDR de Franca deverá manter sua rota de crescente modernização, exibindo ganhos de produtividade e qualidade. Sistemas produtivos com padrões de sustentabilidade mais avançados (lavouras certificadas, orgânicos e ILPF) terão crescente inserção, consolidando ainda mais a cafeicultura que nesse polo se dinamizou.

  

1Os autores agradecem a organização do banco de dados e tabulação conduzida por Gilberto Bernardi, Assistente de Apoio à Pesquisa Agropecuária.

 

2SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Instituto de Economia Agrícola. Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável. Projeto LUPA 2016/17: Censo agropecuário do Estado de São Paulo. São Paulo: SAA: IEA: CDRS, 2019. Disponível em: http://www.cdrs.sp.gov.br/projetolupa/. Acesso em: 17 jun. 2020.

 

3SILVA, J. R. et al. Valor da Produção Agropecuária por Escritório de Desenvolvimento Rural do Estado de São Paulo: estimativa de 2019. Análises e Indicadores do Agronegócio, v. 15, n. 5, p. 1-8, maio 2020.  Disponível em:  http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-35-2020.pdf. Acesso em 17 jun. 2020.

 

4CAMARGO, F. P. et al. Previsões e Estimativas das Safras Agrícolas do Estado de São Paulo, ano agrícola 2019/20, fevereiro de 2020. Análises e Indicadores do Agronegócio, v.15, n.4, p. 1-9, 2020. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-22-2020.pdf. Acesso em: 17 jun. 2020.

 

5Op. cit. nota 2

 

6SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Instituto de Economia Agrícola. Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável. Projeto LUPA 2007/08: Censo Agropecuário do Estado de São Paulo. São Paulo: SAA: IEA: CDRS, 2009. Disponível em: http://www.cdrs.sp.gov.br/projetolupa/. Acesso em: 17 jun. 2020.

  

Palavras-chave: produção de café, estatísticas agrícolas, café na alta mogiana.

Data de Publicação: 20/07/2020

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
José Alberto Angelo (jose.angelo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor