Cotações em Queda e Incertezas no Mercado Futuro do Café


 

As ações públicas, visando minimizar os impactos sociais decorrentes da pandemia da covid-19, elevaram exponencialmente o deficit fiscal brasileiro. Aproximando-se de 100% do orçamento público comprometido pelas despesas discricionárias, os investidores buscaram refúgio patrimonial na moeda estadunidense, alavancando suas cotações. A média das cotações da PTAX-BACEN, na última semana do mês de outubro, alcançou R$5,71/US$ (Figura 1).

 

A variação cambial é dos mecanismos mais potentes na formação dos preços das commodities. A desvalorização do real barateia as mercadorias transacionadas internacionalmente. As exportações dos produtos in natura registraram recordes, em setembro de 20202, sinalizando o maior interesse dos compradores devido aos preços competitivos que deverão se intensificar com a aceleração da desvalorização da moeda brasileira.

O incremento dos embarques brasileiros de café em outubro foi igualmente beneficiado pela desvalorização do real, com elevação de 14,5% frente ao mesmo mês do ano anterior, alcançando a cifra de US$510,18 milhões3, correspondendo a 3,91 milhões de sacas de 60 kg no mês. Esse montante transacionado poderia ter crescido ainda mais caso não houvesse queda na oferta de contêineres nos portos brasileiros, afetando em estimados 4,4% os embarques do produto4.

A média das cotações no mercado futuro da Bolsa de Nova York foram cadentes ao longo de outubro de 2020. Enquanto a média das cotações na primeira semana do mês atingia os US$122,00/lbp. as cotações recuaram, na média das cotações da quarta semana, para US$108,13/lbp, ou seja, queda de 11,37% no mês. Aparentemente, os investidores no mercado futuro de café em Nova York acreditam que o suprimento de curto prazo não sofrerá descontinuidade (Figura 2).

 

Cotejando a média das cotações futuras da quarta semana de outubro na Bolsa de Nova York (US$108,13/lbp) com a média dos preços recebidos pelos cafeicultores (sistematizados pelo Instituto de Economia Agrícola) do EDR de Franca, principal cinturão de lavoura cafeeira do Estado de São Paulo, foram pagos R$502,42/sc. tipo 6 bebida dura5 ou US$92,60/sc. pelo dólar médio do mês (R$5,62/US$). Efetuando-se as devidas conversões, esse montante representa US$122,48/sc. Descontando-se os custos de contratação de hedge e o deságio implícito frente ao contrato C (em média de 20%), alcançam-se US$97,98/sc., ou seja, apenas US$5,38/sc. de vantagem financeira frente ao preço spot, montante capaz de atrair cafeicultores para proteção dos preços para seu produto.

Em contraste ao mercado futuro de café arábica, as cotações no mercado de café robusta negociado na Bolsa de Londres, após exibirem quedas na média das duas primeiras semanas do mês, passaram a se elevar encerrando em alta na média última semana (Figura 3).

 

Notícias de que as condições climáticas não têm favorecido a colheita das lavouras vietnamitas geraram preocupações entre os investidores desse mercado quanto à segurança do fluxo de suprimento, alavancando as cotações do produto. Em contrapartida, os embarques brasileiros estão em ritmo crescente, evoluindo 22,34% nos embarques de conilon, comparando-se as quantidades exportadas entre janeiro e setembro de 2020 (3,73 msc.) e igual período do ano anterior (3,05 msc.)6. Tal incremento das vendas internacionais reflete a competitividade em preços do produto brasileiro obtida em razão da acentuada desvalorização do real no corrente ano.

Em consonância com o comportamento das cotações futuras do arábica em Nova York, os fundos e grandes investidores se retraíram ao longo do mês com progressivo incremento das posições vendidas (Tabela 1). Ainda assim, o mercado mantém posição líquida favorável aos compradores. As consecutivas notícias de frustração de safra no Brasil (efeito da estiagem prolongada em época de florada dos cafezais) deverá incentivar a alavancagem das posições compradas em curto prazo.

 

O final de 2020 enseja o início da entressafra de café do Brasil. Acrescenta-se a essa sazonalidade o ano de baixa do ciclo bienal e que, reconhecidamente, haverá prejuízos da safra decorrentes do clima adverso7, o que deverá promover um retorno dos investidores as compras de contratos futuros, alavancando as cotações. A decretação de lockdown em várias nações europeias e do Meio-Oeste estadunidense, em função da emergência de segunda onda de contágios pelo coronavírus, pode baixar a demanda por café, adiando a possível aceleração das cotações. Há, portanto, um ambiente incerto para os negócios com café, mas a qualidade e a competitividade dos cafés do Brasil podem se firmar sobre os concorrentes mesmo nesse momento de incertezas.

 

 

 

1O autor agradece o trabalho de sistematização do banco de dados econômicos conduzido por Paulo Sérgio Caldeira Franco, Agente de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do IEA.

 

2Entre janeiro a setembro de 2020 e igual período do ano anterior, o agronegócio brasileiro elevou o valor em dólar de suas exportações em 7,5%. Ver: GHOBRIL, C. N.; ANGELO, J. A.; OLIVEIRA, M. D. M. Balança Comercial dos Agronegócios Paulista e Brasileiro, Janeiro a Setembro de 2020. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 15, n. 10, out. 2020. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/AIA/
AIA-85-2020.pdf. Acesso em: 3 nov.2020.

 

3CAFÉ/SECEX: receita com exportação em outubro aumenta 14,5%, para US$ 510,18 mi. Notícias Agrícolas, Campinas, 3 nov. 2020. Disponível em: https://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/cafe/272749-cafesecex-receita-com-exportacao-em-outubro-aumenta-145-para-us-51018-mi.html#.X6xLcN5Kjcspdf. Acesso em: 3 nov. 2020.

 

4GARCIA, D. Boom do agronegócio camufla queda na circulação de contêineres do porto de Santos. Revista Portos e Navios, Rio de Janeiro, 3 nov. 2020. Disponível em: https://www.portosenavios.com.br/
noticias/portos-e-logistica/boom-do-agronegocio-camufla-queda-na-circulacao-de-conteineres-do-porto-de-
santos#:~:text=Boom%20do%20agroneg%C3%B3cio%20camufla%20queda%20na%20circula%C3%A7%C3%A3o%20
de%20cont%C3%AAineres%20do%20porto%20de%20Santos,-Da%20Reda%C3%A7%C3%A3o%20Portos&text=O%20
porto%20de%20Santos%20vem,mesmo%20per%C3%ADodo%20do%20ano%20passado.&text=Na%20an%C3%A1lise

%20de%20janeiro%20a,foi%20de%207%2C05%25.
Acesso em: 3 nov. 2020.

 

5INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Banco de dados. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/precosdiarios/precosdiariosrecebidos.aspx?cod_sis=6. Acesso em: 5 nov. 2020.

 

6CONSELHO DOS EXPORTADORES DE CAFÉ DO BRASIL. Relatório Mensal outubro de 2020. São Paulo: CECAFÈ, 2020. Disponível em: https://www.cecafe.com.br/publicacoes/relatorio-de-exportacoes/. Acesso em: 5 nov. 2020.

 

7TEIXEIRA, M. Nova safra de café do Brasil deve recuar entre 14% e 21%, diz Itaú BBA. Reuters, Londres, 5 nov. de 2020. Disponível em: https://br.reuters.com/article/businessNews/idBRKBN27L2HL-OBRBS. Acesso em: 5 nov. 2020.

 

 

 

 

Palavras-chave: mercado futuro, bolsa de mercadorias, cotações do café.

 

 

 

 

 

COMO CITAR

VEGRO, C. L. R. Cotação em Queda e Incertezas no Mercado Futuro do Café. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 15, n 11, nov. 2020. Disponível em: color o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 16/11/2020

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor