Análise de Conjuntura e Perspectivas do Agro 2020 – carne bovina e carne suína

 

CARNE BOVINA

         O mercado de carne bovina, em 2019, foi diferente de outros anos, pois no seu segundo semestre os preços do boi gordo estiveram muito altos, chegando a recordes em novembro. Isso afastou o consumidor, levando-o a optar por outros tipos de proteína. Ao mesmo tempo, houve um aumento das exportações com a ampliação das vendas para a China, em função da peste suína africana, mas elas já sofreram impacto negativo no início de 2020, devido à estabilização das compras chinesas.

Segundo o IEA, os preços do boi gordo para o produtor em 2019 tiveram altas expressivas e, em novembro e dezembro, estiveram ainda mais elevados, de 19,4% e 39,4%, respectivamente, alcançando no último mês do ano o valor de R$204,55 ante os R$148,99 de janeiro, subindo 37,3%% no período1.             

Os dados do IEA para o varejo mostraram que os preços tiveram altas em quase todo ano e foram maiores para a carne de segunda. Em julho e agosto, período da entressafra, houve baixa. Nos últimos dois meses do ano, os preços dispararam para o acém (carne de segunda), com 14,8% em novembro e 30,0% em dezembro, e para a alcatra (carne de primeira), com 12,7% e 24,4% respectivamente, refletindo os preços da arroba do boi gordo, mas com variação menor que os preços ao produtor devido à fuga do consumidor por causa do alto valor do produto. O preço médio anual para o acém foi de R$18,71, e de R$31,41 para a alcatra, e a alta entre o primeiro e último mês do ano alcançou variação de 23,6%2. Esses altos valores do fim de 2019 impactaram o índice inflacionário do país.

Com os preços mais elevados praticados no varejo e o baixo poder de compra do consumidor, este deixou de adquirir carne bovina ou diminuiu o dispêndio com ele, dando preferência a outras proteínas, como ovo, frango e suíno, fato que, agregado ao habitual maior consumo de outras carnes no mês de dezembro, atenuou o consumo dessa proteína. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) fala em queda de 2% no consumo interno3.

As exportações são muito importantes para o setor, pois possibilitaram o escoamento da produção e a sustentação dos preços do mercado interno da arroba do boi e da carne bovina. Em 2019, as exportações da carne bovina do Brasil cresceram 14,7%, enquanto o faturamento aumentou 18,9%. No Estado de São Paulo, o crescimento foi de 6,2% em volume e 16,67% em valor4.

A peste suína na China afetou fortemente o mercado mundial de carnes, o que contribuiu com o aumento da produção e da exportação de proteínas do Brasil. No caso da carne de boi, o principal destino foi a China que junto com Hong Kong foram os países que mais adquiriram a carne brasileira. A maior receita também teve relação com a alta cotação do dólar.

A expectativa para 2020 é que a demanda chinesa continue aquecida e as vendas cresçam. Entretanto, o acordo entre a China e os Estados Unidos poderá interferir nas perspectivas da exportação brasileira, já que há o comprometimento do país asiático de compras maciças de produtos agrícolas norte-americanos, embora o presidente Donald Trump tenha tido dúvidas em relação ao atendimento da demanda chinesa5. Os incêndios na Austrália também devem afetar o mercado internacional, pois a queda de oferta de carne desse país abrirá espaço para mais vendas brasileiras.

Segundo o Rabobank6 e USDA7, estima-se para 2020 que a produção de carne bovina do Brasil cresça para cerca de 10,5 milhões de toneladas, frente aos 10,1 milhões de toneladas de 2019; a exportação, tanto de carne bovina como suína, deve apresentar as maiores altas em 2020 com crescimento em torno de 10,6% nos embarques da carne bovina.

A perspectiva é que o mercado continue bom para o setor devido à pouca oferta de bois para abate, à demanda internacional aquecida, e ao ótimo preço da arroba do boi, lembrando que por conta dos bons preços, houve abate de fêmeas, inclusive do setor leiteiro. Além disso, os preços considerados baixos por operadores de mercado entre 2017 e o início de 2019 desestimularam parte dos pecuaristas, o que freou o ritmo de investimentos nos últimos anos.

O produtor de boi, assim como a indústria, deverá ter em mente cada vez mais que preços altos no mercado interno afastam o consumidor e que suas maiores possibilidades ainda continuam nas vendas externas, nas quais já se consagrou como player fundamental. No entanto, ele deve estar atento ao comércio interno, pois ele tem boa demanda se os preços forem acessíveis, o que o torna importante caso haja algum problema no mercado mundial.

 

 

CARNE SUÍNA

         O mercado de suínos foi extremamente movimentado em 2019 devido à constatação de peste suína africana (PSA) na China, no Sudoeste da Ásia e em países europeus. Isso levou a uma movimentação do mercado mundial para atender a demanda da China por carne suína e de outros tipos, o que a princípio foi extremamente benéfico para o Brasil.

As características da suinocultura nacional têm nuances diferentes conforme a região produtiva. Vão desde a criação em pequena escala para o autoconsumo até a produção em larga escala para a comercialização em nível nacional e para o mercado externo. É necessário ponderar ainda a gradação do nível tecnológico associado a essa variação na escala de produção.

Os dados do IEA indicam que a suinocultura no Estado de São Paulo, nos últimos anos, teve dificuldades em manter ou ampliar sua produção, atingindo o rebanho de 894,2 mil cabeças em 2019 e 1,3 milhão de cabeças abatidas, que devem totalizar 103,9 mil toneladas de carne8.

O abate de suínos, no último trimestre de 2019, segundo levantamento do IBGE, foi de 11,87 milhões de cabeças, alta de 6,1% em relação ao ano anterior9.

A carne suína e a de frango têm a posição de fontes proteicas mais importantes para a alimentação humana no mundo. A produção brasileira ocupa o quarto lugar no fornecimento ao mercado externo, posição que leva os estados do Sul a obterem os melhores frutos dessa posição no mercado mundial.

O segmento paulista da cadeia de produção de suínos usa sua diversidade de produção e as características do consumo da sua população ser voltado mais para a carne suína in natura como estratégias de mercado, operando de forma a manter sua fatia no total de produção de carne suína nacional.

O ano de 2019, conforme o IEA, iniciou com queda nos preços médios mensais recebidos pelos agricultores para o suíno para abate. Em fevereiro, já subiram 9,3%. A média anual de preços foi de R$90,10 contra os R$67,24 de 2018, o que representou +34,0%. Em julho, houve a maior alta do ano (61,3%) e em dezembro a cotação chegou a R$117,05/@, alta mensal de 54,8%10.

Os preços médios mensais do varejo da carne suína caíram nos três primeiros meses de 2019, segundo dados do IEA. Em abril, passaram a se recuperar com aumento variando de 2,9% a 5,8%. Os dois últimos meses do ano tiveram as maiores altas, de 10,0 % e 22,9%11.

         A quantidade de carne suína brasileira exportada em 2019 teve crescimento de 18,0% em relação a 2018, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior12. Um crescimento ainda maior foi obtido no valor das vendas, 37,5% acima de 2018. Os animais vivos tiveram queda no volume de 6,0% e aumento dos preços com uma alta de 27,8%. O alto valor do dólar ajudou no crescimento do faturamento com obtenção de receita recorde para o país.

Em São Paulo, o volume exportado é muito pequeno, pois a produção paulista atende mais o mercado interno com carne fresca. Ainda assim, este cresceu 8,5%, com o valor alcançando 41,1% de alta. No caso dos suínos vivos, o volume vendido caiu 59,1% e as cotações baixaram também em 7,5%. Mesmo a alta do volume exportado não representou volume importante nas exportações do país13.

         A abertura de novos mercados é fundamental para as vendas do país que se concentraram por muitos anos na Rússia, comprometendo as exportações por várias vezes, quando os russos impuseram bloqueio das compras devido a questões sanitárias, inclusive da carne bovina.

As importações de carne suína feitas pelo Brasil que eram baixas zeraram em 2019, o mesmo ocorrendo em São Paulo. Em relação ao suíno vivo, o país aumentou as compras em 53,6% no país e 22,2% no Estado de São Paulo. O valor (US$ FOB) mais alto foi de 104,3% no país e de 12,4% no estado em questão14. Esse crescimento das vendas teve relação com o atendimento da expansão da demanda chinesa.

As principais vendas do Brasil foram para China, seguida de Hong Kong. Assim como nos Estados Unidos, no Brasil há expectativa de que o crescimento das exportações continue frente à demanda chinesa, que é altíssima. Em janeiro, no entanto, alguns problemas ocorreram e deixaram produtores e frigoríficos apreensivos, pois a China tomou algumas medidas para a renegociação de contratos, impondo descontos de 30%. Com isso, a rentabilidade dos frigoríficos, principalmente a dos pequenos, caiu, levando a prejuízos. Além disso, a China tem liberado a compra de carnes de países pouco tradicionais no comércio de carne suína, como é o caso da Bolívia. Ao mesmo tempo, derrubou o embargo às carnes inglesa (de 20 anos) e canadense, assim como ampliou o número de frigoríficos argentinos habilitados15.

Tal movimento faz crer que as maiores oportunidades para o Brasil serão para os grandes frigoríficos brasileiros que têm estrutura para atender grandes demandas e maior conhecimento e condições de negociação.

Outra oportunidade são os mercados chileno e uruguaio que, em 2018, aumentaram as importações da carne suína brasileira. Esse fato possibilitou a compensação das perdas tidas pelo Brasil com a queda de suas exportações de carne suína para a Argentina16.

Internamente, segundo pesquisa feita pela Rojo Marketing de Alimentos em 2019, há melhor aceitação da carne suína pelo consumidor e ampliação de profissionais da saúde que a indicam nas dietas saudáveis. Isso derivou de esforço de anos para mudar o preconceito em relação a essa carne. O resultado foi o aumento de 15,9% no consumo, em 2018, que alcançou 14,2 kg per capita/ano17.

Como um dos principais centros de consumo no país, o mercado paulista de carne suína e derivados não se limita à sua produção própria, complementando sua demanda com a produção de outros estados, principalmente em carne congelada e embutidos.

As expectativas para 2020 são positivas. Acredita-se que as exportações do Brasil podem aumentar 20% no mercado mundial, que deve crescer 7,7% em relação a 2018 (MARTINS ET AL, 2019)18. Internamente, espera-se que o consumo melhore em função dos altos preços da carne bovina e da melhor aceitação desta carne pelo consumidor nos últimos anos.

                                          

 

 

 

 

1INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Preços médios mensais recebidos pelos agricultores. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/nia1/precos_medios.aspx?cod_sis=2. Acesso em: 6 jan. 2020.

 

2INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Preços médios mensais no varejo. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/nia1/precos_medios.aspx?cod_sis=4. Acesso em: 6 jan. 2020.

 

3UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE. Foreign Agricultural Service. Livestock and Poultry: World Markets and Trade. Washington: USDA: FAS, 2020. Disponível em:  https://apps.fas.usda.gov/psdonline/circulars/livestock_poultry.pdf. Acesso em: 13 jan. 2020.

 

4MINISTÉRIO DA ECONOMIA. Secretaria de Comércio Exterior. Sistema ComexStat. Brasília: ME: SECEX, 2020. Disponível em: http://comexstat.mdic.gov.br. Acesso em: jan. 2020.

 

5'FASE 2' do acordo entre EUA e China deve sair após eleições, diz Trump. G1, São Paulo, 9 jan. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/01/09/fase-2-do-acordo-entre-eua-e-china-sairia-apos-eleicoes-diz-trump.ghtml. Acesso em: 10 jan. 2020.

 

6PROJEÇÃO de exportação brasileira de carne em 2020 é de 2,39 mi/t, diz Rabobank. GloboRural, São Paulo, 29 nov. 2019. Disponível em: https://revistagloborural.globo.com/Noticias/Economia/noticia/2019/11/globo
-rural-projecao-de-exportacao-brasileira-de-carne-em-2020-e-de-239-mit-diz-rabobank.html
. Acesso em: 7 jan. 2020.

 

7Op. cit. nota 3

 

8INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Banco de dados. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://www.
iea.sp.gov.br/out/bancodedados.html. Acesso em: fev. 2020.

 

9TRIMESTRAIS da pecuária – primeiros resultados: abate de bovinos cai e de suínos e frangos sobe no 4º trimestre de 2019. Agência IBGE Notícias, Rio de Janeiro, 13 fev. 2020. Disponível em: https://agenciadenoticias.
ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/26887-trimestrais-da-pecuaria-primeiros-resultados-abate-de-bovinos-cai-e-de-suinos-e-frangos-sobe-no-4-trimestre-de-2019.html.
Acesso em: 14 jan. 2020.

 

10Op. cit. nota 1.

 

11Op. cit. nota 2.

 

12Op. cit. nota 4.

 

13Op. cit. nota 4.

 

14Op. cit. nota 4.

 

15MENDES, L. H. Na China, vender carne é um negócio para gigantes?. Valor Econômico, São Paulo, 23 jan. 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/agronegocios/noticia/2020/01/23/na-china-vender-carne-e-um-negocio-para-os-gigantes.ghtml. Acesso em: fev. 2020.

 

16FRANCO. M. M. et al. Conjuntura econômica da suinocultura brasileira. Anuário 2020 da Suinocultura Industria, Itu, edição 291, ano 42, n. 6/2019. Disponível em: https://www.suinoculturaindustrial.com.br/edicao/20191216-093403-D158. Acesso em: 13 jan. 2020.

 

17CARVALHO, P. Conheça a atual visão do consumidor brasileiro sobre a carne suína. Suinocultura Industrial, Itu, 7 Jan 2020. Disponível em: https://www.suinoculturaindustrial.com.br/imprensa/conheca-a-atual-visao-do-consumidor-brasileiro-sobre-a-carne-suina/20200107-083645-b207. Acesso em: 13 jan. 2020.

 

18Op. cit. nota 16.

 

Palavras-chave: carne bovina e suína, São Paulo e Brasil, produção, preços, exportação e importação

Data de Publicação: 12/03/2020

Autor(es): Rosana de Oliveira Pithan e Silva (rosana.pithan@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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